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Igreja: comunidade de amor e de esperança!

I.Igreja: assembléia santa, comunidade de amor

 Introdução: Este nosso curso de eclesiologia tem como finalidade primeira nos levar a um contato vivo e real com a Igreja: comunidade viva de amor! Assim os primeiros cristãos eram designados, assim eles se compreendiam, como comunidade utópica, sonhadora dos sonhos de Deus.Os seguidores do Caminho, os primeiros cristãos, não tinham uma clara identidade cristã, como nós hoje entendemos. Viviam a vida imergida no Mistério. O batismo, além de porta de entrada na vida cristã, era o ponto máximo do percurso dos seguidores do Mestre Jesus.

O Novo Testamento surge no cenário inicial como testemunho da fé das primeiras comunidades. Elas sentem a necessidade de narrar os feitos, as experiências marcantes que Jesus imprimiu nos discípulos: Evangelho e Igreja são duas faces de uma mesma moeda. Por isso, cada evangelho é na verdade uma tentativa de ler a própria comunidade à luz da vida pascal, da vida em Cristo! A tentativa era de deixar aos cristãos, das gerações seguintes, o testemunho escrito de uma realidade que era vivida e sentida como própria, realizada no coração da comunidade que vivia em torno da Eucaristia e das leituras do Antigo Testamento. O Cristo ressuscitado era a fonte primeira da reunião da comunidade, a razão de ser dos discípulos-seguidores. Esta palavra discípulo-seguidor tinha uma conotação especifica, indicava a relação vital e a situação nova do homem novo, nascido do banho de re-generação. Era necessária uma comunhão vital com a Pessoa mesma de Jesus. Uma experiência do Ressuscitado, cujo ponto máximo nasce da refeição feita em comum, da recordação memorativa da Páscoa do Senhor: “Fazei isto em memória de mim”.

1.     A Igreja nasce como comunidade celebrativa da memória de Jesus

A memória e seu caráter regulativo de celebração só se tornou possível porque Jesus ressuscitou. A morte estava vencida. Abria-se a porta para a esperança da proximidade do futuro de Deus. O mistério do Reino anunciado por Jesus, agora era palpável. É em virtude da certeza de que o Crucificado está vivo, que se fundava a vida desta nova comunidade de fé. A Igreja, portanto, em seu fundamento e raiz é uma comunidade de fé, nasce da fé e na fé se encaminha para a sua meta, na qual será a total transparência de Deus, pois Deus a plantou no mundo como sinal e instrumento de seu operar definitivo onde um dia “Ele será tudo em todos”.

Assim, a ressurreição além de fundamentar o sentido desta comunidade, possibilitava uma nova configuração no meio do povo de Israel. A ressurreição lançava uma nova luz sobre o enigma de Jesus, o mestre de Nazaré. Sua pregação, seus milagres, suas palavras e feitos adquiriam uma nova conotação e uma nova força no seio da comunidade. Dissipava o véu que cobria-lhes a visão:

Pois, se o que era passageiro foi marcado de glória, muito mais glorioso será o que permanece. Tendo uma tal esperança, procedemos com toda a segurança, e não como Moisés, que cobria o rosto com um véu, para que os israelitas não vissem o fim de um brilho passageiro. Mas o entendimento deles ficou embotado. Até o dia de hoje, quando fazem a leitura da antiga Aliança, esse mesmo véu continua descido, porque só em Cristo ele é removido. Até o dia de hoje, quando lêem os escritos de Moisés, um véu cobre o coração deles. Mas, todas as vezes que o coração se converte ao Senhor, o véu é tirado. Pois o Senhor é o Espírito, e onde está o Espírito do Senhor, aí está a liberdade. Todos nós, porém, com o rosto descoberto, refletimos a glória do Senhor e, segundo esta imagem, somos transformados, de glória em glória, pelo Espírito do Senhor (2Cor 3,13-18).

Agora tinha sentido narrar os fatos de Cristo. Mas são fatos contados e narrados à luz da ressurreição, este fato determina o conteúdo dos textos neo-testamentário. Neste sentido, podemos afirmar com simplicidade e clareza que os evangelhos e os livros do Novo Testamento não são livros auto-biográficos da vida de Jesus, mesmo contendo traços reais da vida do Nazareno. Eles são textos para pregação, são kerigmaticamente inspirados, para serem anunciados como palavra portadora de sentido e de vida. Sua finalidade última é testemunhar que Jesus, o crucificado, vive e entrou na esfera de Deus – “Está sentado a direita de Deus”; e como “Senhor” se encontra numa nova situação de vida que serve de fundamento para nossa esperança, porque assim Ele se manifestou aos seus discípulos, como Senhor glorificado pelo Pai: “Quem crê em mim não morrera, mas terá a vida eterna!”.

Era necessário, pois, um caminho. Não bastava a boa vontade para sustentar essas primeiras comunidades nascida da experiência do ressuscitado. A ressurreição delineava um novo estilo de vida no seio da humanidade. Este estilo estava sendo forjado pela ação plena do Espírito de Cristo. No meio dos ventos de pressentimentos, o Espírito firmava os cristãos na certeza; em meio às dúvidas, Ele impulsionava à profissão de fé. Ele auxilia os discípulos a fazerem a longa passagem do Cristo que prega ao Cristo pregado, do Jesus anunciador do Reino, ao Cristo, o próprio Reino de Deus entre nós, isto é: de portador da mensagem ao conteúdo central da fé. Ele não é apenas o mero pregador nas vias da Galiléia, mas agora abre-se os olhos dos discípulos que sabem enxergar nele o próprio dom de Deus, que nos plenifica a vida, nos enche de alegria e antecipa para nós a presença viva de um amor que nos gera de novo. Estamos no centro da formação da teologia batismal, núcleo agregador e pólo necessário de discernimento para os que desejam ingressar na vida nova oferecida por Jesus de Nazaré.

 2.     Igreja: comunidade de batizados

Tudo começava a se estruturar como comunidade batismal. Tal consciência forçava os primeiros cristãos a elaborarem uma fundamentação que desse respaldo às suas experiências. Era preciso ler então Cristo e seu destino na fiel continuidade com o Povo de Israel. Não podia haver retalhos e nem improvisos. A seriedade tocava a todos. Cada evangelista terá, portanto, um ângulo especifico para fazer sua leitura “evangélica”. Cada qual busca então ler sua própria comunidade sobre dois eixos:

  1. Cristo: plenitude da vida de todo homem;
  2. A Igreja: herdeira das promessas do Deus de Israel.

Tal tentativa leva conseqüentemente a uma conscientização das primeiras comunidades cristãs de seu próprio Mistério. As elaborações teológicas são muito simples, bebem das fontes das Escrituras, sabem se reconhecer nelas:

As duas Alianças: alegoria de Agar e Sara

Dizei-me, vós que quereis sujeitar-vos à Lei: não ouvis o que diz a Lei? Com efeito, está escrito que Abraão teve dois filhos, um da escrava e outro da livre. Mas o filho da escrava nasceu segundo a carne, e o filho da livre nasceu em virtude da promessa. Esses fatos têm um sentido alegórico, pois essas mulheres representam as duas alianças. A primeira, Agar, que vem do monte Sinai, gera filhos para a escravidão: Agar representa o monte Sinai, que se encontra na Arábia, mas corresponde à Jerusalém atual, que é escrava com os seus filhos. A Jerusalém do alto, ao contrário, é livre; e é a nossa mãe. Pois está escrito:“Rejubila, estéril, que não dás à luz, prorrompe em gritos de alegria, tu que não sentes as dores do parto, porque os filhos da mulher abandonada são mais numerosos do que os da mulher que tem marido”. E vós, irmãos, como Isaac, sois filhos da promessa. Mas, como naquele tempo o filho segundo a carne perseguia o filho segundo o espírito, assim acontece também agora. Entretanto, que diz a Escritura? “Expulsa a escrava e seu filho, pois de modo algum o filho da escrava será herdeiro, junto com o filho da livre”. Portanto, irmãos, não somos filhos de uma escrava; somos filhos da mulher livre (Gl 4,21-30).

Neste sentido, vemos como Paulo, teólogo e exegeta da Lei, discípulo do grande mestre Gamalieu, ao se converter usa todas as formas de retóricas e de persuasão, que ele havia adquirido nas escolas rabínicas, para entender Cristo e seu mistério, e por conseqüência as comunidades por ele fundadas, à luz do Antigo Testamento. Esse primeiro exercício de interpretação da própria vivência comunitária em torna da “memoria Chisti” leva, pouco a pouco, os cristãos a se situarem diante do Judaismo, não como desprezo, nem como altivez, nem muito menos como algo paralelo e de justaposição ao judaísmo, mas como realização das promessas feitas aos Pais, pelos profetas. Eles ainda não são denominados cristãos, isso ocorrerá mais tarde, no terreno pagão, na região oriental, em plena Antioquia. Para eles, sobretudo, para São Paulo, o primeiro interprete e escritor dos livros neo-testamentários, o que está em jogo neste momento é a busca de responder que tudo o que ocorreu em Cristo é fidelidade de Deus, o Pai, às suas promessas antigas.

 3.     O evangelho de Paulo: sinal dinâmico da Palavra criadora da comunidade

Paulo teve a ousadia de chamar seus primeiros escritos de Evangelion (evangelho), num período que ainda não havia nem uma elaboração dos escritos do Novo Testamento. Para ele, Jesus é o Evangelho do Pai, a Palavra operante de Deus, o Davar bíblico, Palavra criadora e geradora de sentido, da qual tudo veio e para qual tudo retorna. É o primeiro indício de uma teologia da Palavra. Tudo se funda nela, tudo vem dela e agora, o passo mais original, tudo tem retorno a Deus nessa Palavra que brotou do próprio Deus, e que em Cristo assumiu uma face humana. É nessa teologia da Palavra que Paulo irá elaborar a teologia da reconciliação, que se dá através de Cristo Jesus, pois ele é a própria Justiça de Deus, justiça que se faz agraciando o pecador, dando-lhe uma nova vida, o dom da re-generação, fundamento necessário dos novos herdeiros das promessas que devem viver em estado de justiça e amor, feito de laços solidários e fraternos, pois “o Reino de Deus não é comida e nem bebida”, imagens vivas de um mundo pagão, marcado pelas competições e rivalidades, pelas concorrências e exclusões, frutos de um mundo de disputas e tiranias, mas “o Reino de Deus é paz, justiça e gozo, no Espírito Santo”.

Por isso o cristão se reconhece na escola da gratidão que é a Eucaristia, antecipação do banquete celeste, no qual um dia o próprio Deus se porá a servir a todos. Assim o cristão sem nada merecer, sabe reconhecer que tudo vem de Deus. Ele (o cristão) se acha numa nova situação diante de Deus. Sem Deus no mundo, os homens viviam em estado de orfandade, pois todos pecaram, e, portanto todos estavam privados da Glória de Deus. Para Paulo, aqui entra de cheio o primado da graça sobre todo o Criado. O mundo é agraciado porque o mundo tem sua origem e fundamento em Cristo e através de sua Morte-Ressurreição, adquire sua verdadeira meta e orientação, portanto Páscoa, a passagem decisiva do mundo precário e transitório, para o mundo em Deus, o mundo da consistência. A passagem necessária para uma vida estável, que sai das intempéries e das agitações mundanas, do reino do provisório para o Reino escatológico de Deus. 

Estas primeiras interpretações começam a fornecer às comunidades paulinas uma primeira auto-consciência de sua própria identidade. Tratava-se de um momento único na qual o apóstolo Paulo vivia, ele estava no confronto de duas linhas que tendiam cada vez mais a se dissociar no seio das primeiras comunidades cristãs. Se esta divisão imperasse o cristianismo teria se encaminhado por outros rumos. Tratava de ligar o mundo dos judeus, herdeiros das promessas (Rm 8-11), com o mundo dos Pagãos. A empreita era grande. E não houve isenções de sacrifícios e dores. Paulo teve que sofrer na pele, mas aceitou pagar o preço.

Internamente, a pressão era mais pungente, os judeus-cristãos não eram muito favoráveis a uma helenização do cristianismo, isto é: a evangelização dos pagãos. Era necessário uma imposição dos costumes judeus. Tratava-se da tendência proselitista de algumas comunidades cristãs. Estas tinham como lideres alguns dos apóstolos, como Tiago, que acabou por fazer Pedro ceder a pressão do grupo (Gl 2, 1-14).

A outra pressão vinha do seio do próprio judaísmo. Os cristãos como acenamos acima, não se sentiam expatriados, nem muito menos não-judeus. Eles eram judeus que assumiram as promessas dos pais realizadas em Cristo. Freqüentavam as Sinagogas aos sábados, mantinham costumes judaicos, não queriam um rompimento nítido com o judaísmo. Sentiam-se em continuidade e na plena fidelidade dos herdeiros das promessas abraamicas. Mas não tardou para que houvesse uma perseguição clara e imediata. O próprio Paulo, antes de sua conversão, acena muitas vezes que ele mesmo se pôs a perseguir os “seguidores do Caminho”.

Buscar uma alternativa média, cheia de diplomacia e cautela, seria a posição mais viável. Mas o Novo Testamento testemunha que o caminho foi a de abertura e diálogo com o mundo pagão. O preço foi a de uma novidade incrível na história cristã.

Podemos dizer que venceu uma linha já delineada por Paulo pela sua teologia da Palavra e do Primado da Graça. Tratava-se da linha universalista. Era então preciso compreender o mistério cristão como um mistério de Deus feito para toda humanidade. Isso não negava de maneira alguma a particularidade do cristianismo, que tinha sua centralidade, meta e orientação fundamental em Cristo Jesus. “Nele somos, vivemos e nos movemos”. “tudo foi feito nele, por ele e para ele (Ef)”. Posteriormente, esta linha ganhará realce nas cartas pastorais de Paulo. O apostolo aconselha o jovem Timóteo a se deixar mover pelo desejo de Deus que “quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade”. É necessário que toda reflexão, se quer ter respaldo teológico e pastoral, considere com muita atenção esta “vontade salvifico-universal” de Deus.

As bases estavam postas. Agora se tornava possível delinear os traços que nos permitem hoje entender a própria formação da consciência das primeiras comunidades cristãs. As vezes, esses contornos das primeiras comunidades só são compreensíveis de forma implícita, outras são mais claras! Mais umas e outras vão pouco a pouco se impondo no cenário da Igreja dos gentios. Uma igreja que se sabe agora aberta e universal. Uma igreja que se sabe também necessitada dos instrumentais humanos da época: a língua grega, os meios humanos do império romano, a recorrência à cidadania romana para fugir aos ataques dos judeus. Os cristãos saberão usar estes instrumentais com muita perspicácia, sem contar que também eles se beneficiarão com a influência das famílias romanas e com os seus suportes, quando começar a eclodir as perseguições dentro do Império.

Outros aspectos poderiam ser aqui ressaltado da teologia eclesial de Paulo. Mas isso nos levaria a outros tratados da teologia sistemática e exigiria de nós um maior esforço de concentração. A intenção aqui é somente nos introduzir no mistério da Igreja através dos primeiros escritos cristãos, e estes saíram das penas de Paulo. Para Paulo a Igreja é uma assembléia de amor, um povo de convocado e que se reúne para deixar o Deus vivo e verdadeiro esculpir nele o rosto de Cristo:

“Será que começamos de novo a recomendar-nos? Ou acaso precisamos, como certas pessoas, de cartas de recomendação para vós ou da vossa parte? Vós é que sois a nossa carta, escrita em nossos corações, conhecida e lida por todos. Todo o mundo sabe que sois uma carta de Cristo, redigida por nosso intermédio, escrita não com tinta, mas com o Espírito de Deus vivo, não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, os corações. O ministério da nova aliança” (2Cor 3,1-3).

É assim que começa a prefigurar o rosto da Igreja em Paulo. Temos uma Igreja concreta, palpável. Ela tem leis próprias, superior à Tora. Seu fundamento é o amor, “pois quem ama cumpriu toda lei”: “A letra mata, o Espírito é que dá a vida” (2Cor 3,6).  Esta lei nasce da liberdade do Espírito, própria dos filhos de Deus. Tal liberdade não pode justificar a libertinagem, “pois foi para a liberdade que Cristo vos libertou”. A Igreja, assembléia dos batizados, sente-se depositaria desses dons, destinatária dessas dádivas divinas. Deve proteger qual tesouro em vasos de barros. Paulo conhece bem as fraquezas humanas, tanto em sua vida, quanto na vida dos irmãos. Às vezes, trata-se de espinhos fortes e permanentes. Mas nada disso deve desanimar os cristãos de perseguir no bom combate, de perseverarem na fé e de esperarem com confiança a coroa da Glória: “pois nada pode nos separar do amor de Deus, que em Cristo nos amou e por nós se entregou”.

O cristão se sabe convidado a ser um atleta de Cristo. A imagem é bela, não basta malhar o corpo é preciso aprender a exercitar a alma. O corpo busca glórias perecíveis, a alma é a única capaz de conseguir os tesouros celestes. A Igreja é, portanto, a alma da humanidade, a sua essência, como dizia um autor antigo: “O que a alma é para o corpo, os cristão são para o mundo” (Origines). Aqui já se começa a desenhar os traços da Igreja do Novo Testamento, norma e fundamento da Igreja de todos os tempos e lugares!

Essas imagens de Paulo sobre a fisionomia das primeiras comunidades cristãs nos ajudam a redefinir hoje, com os estudos da exegese e da hermenêutica, os verdadeiros pontos decisivos e essências do cristianismo. Mantém-nos alertas para os perigos extremos do fanatismo proselitista, para a tendência de um fechamento inter-eclesial que imobiliza as forças da evangelização. Mantém-nos também alertas para as tendências de certas euforias comunitárias que se arriscam a cair na plena anarquia. Esses erros precisam ser lembrados para jamais serem repetidos.

Ao lado desses constantes perigos, o Novo Testamento sublinha um quadro muito belo da Igreja, põe as bases da sua essência que permanecerão válidas para todas as épocas do cristianismo. Mas a frente, iremos aprofundar as imagens viventes que São Paulo usa para se referir à Igreja. Essas imagens serão clássicas na teologia de todos os tempos. Algumas delas receberão grande relevo em determinados momentos da história da Igreja, outras serão mais acentuadas em algumas tradições cristas em detrimento de outras. Assim, podemos fazer uma rápida alusão às imagens da Igreja como:

  1. Povo de Deus – em via de peregrinação, não definitiva, e portanto, necessitada de conversão em sua historia. Nesta imagem não existe diferença e separação, todos se sentem chamados a vivenciar o mesmo destino de povo de peregrinos. Esta imagem foi bem realçada no Concílio Vaticano II. Serve hoje de corretivo para uma imagem de Igreja demasiadamente burocrática e funcional, muitas vezes frias e vazias do espaço humanizante e solidário.
  2. Corpo de Cristo – aqui se elabora pela primeira vez a imagem de organismo, a Igreja ganha realce enquanto estrutura. Seu caráter de instituição se afirma. Trata-se de uma imagem muito predominante na teologia ocidental da tradição católica-romana. Esta imagem ganha seu ápice doutrinal na Enciclica “Mistici Corporis” de Pio XII e no título que se conferiu a Jesus como Rei do Universo, simbolizando a homogeneidade da Igreja, seu poderio histórico, suas forcas terrenas. A Igreja é uma monarquia, que tem Papa como sua voz suprema e última. Aquele que julga todos, e não pode ser julgado por ninguém! Vale aqui o ditado popular: “Roma locuta, causa finita”: quando Roma se pronuncia, cessa-se tudo.
  3. Templo do Espírito Santo – A Igreja nesta imagem é rica. Destaca-se a dimensão feminina da Igreja. Seu perfil é acentuadamente mariano. A atenção se volta para a interioridade da Igreja, ela é mistério e sacramento de salvação. Relativiza-se assim o fator exuberante e dominador, que muitas vezes dominou no Ocidente. Temos aqui uma imagem muito presente na tradição oriental. Essa imagem felizmente foi acolhida com grande apreço pelos bispos latino-americanos na V Conferencia de Aparecida. O DA fez uma clara opção pela imagem mariana da Igreja como antídoto necessário e urgente para vencer a visão burocrática e funcional da mesma.

4.     Igreja: ponto de encontro entre promessa e realização

Uma vez que vimos por alto a Igreja em sua base neo-testamentária nos escritos de Paulo. É necessário fazer um recuo que nos leve a Cristo e de Cristo à história de Israel. Estamos diante de dois pontos importantes da teologia, trata-se da íntima correlação entre o único plano de salvação de Deus, que se realiza em duas etapas, marcadas pelos eixos: criação e redenção. Não estamos diante de uma justaposição de dois pontos desconexos, mas de duas instâncias de um mesmo plano salvífico. Porque é um único plano realizado em duas etapas, não qual a primeira – criação –, implica a segunda – salvação, que por sua vez supõe a primeira. Esse sentido amplo do Plano Salvífico de Deus, os Padres da Igreja chamavam de Economia Salvífica. Esta se baseia em quatros eixos fundamentais:

  1. Tempo de prefiguração: (pré-história bíblica): O justo Henoc, o Justo Noé, e a figura enigmática de Melquisedec.
  2. Tempo de preparação: toda a história bíblica dos Patriarcas, profetas e das instituições de Israel.
  3. Tempo da realização: Novo Testamento – Jesus Cristo e a Igreja
  4. Tempo escatológico: tempo definitivo e consumativo, onde Deus será tudo em todos, e já não haverá divisões e nem mortes.

A partir desses eixos podemos então delinear a figura da Igreja.

5.  A Igreja no sonho de Deus como realização do plano de salvação

A Igreja é na sua mais pura essência um dom. De diversas formas Jesus chamou a atenção para este fato, suas parábolas sobre o banquete no Reino nos revelam este traço fundamental da Igreja; ali é Deus quem dá a festa, quem toma a iniciativa do convite, quem abre o festim. Seu convite atinge a todos, não exclui ninguém. Porém, essas imagens e tantas outras devem ser sempre atualizadas. Isso implica a tarefa de sempre reformular em que sentido falamos de Igreja como dom. Não se trata de uma instância adversa, ou uma entidade separada da humanidade, ou justaposta a ela. Algo caído do céu como um meteriorito, na qual o “eu” humano ingressa. As imagens de barca pode muitas vezes sugerir isso, mas deve ficar claro que uma tal imagem é limitada para manifestar a Igreja.

Podemos dizer em sentido bem teológico que a Igreja é o próprio sonho de Deus para seu Filho amado. Ela é a esposa de seu Filho. O mundo é o palco, o altar onde se dá as núpcias eternas do Cordeiro e da Esposa amada e querida. Neste sentido, a Igreja é alguém. Superamos a imagem objetivista de Igreja, muito visível nas imagens citadas acima, e assim adentramos no terreno do mistério da Igreja como uma realidade personificada, digna de amor e, por isso, digna de ser escolhida. A Igreja, desse modo, só pode ser definida então como a humanidade em sua totalidade, em seu conjunto. Que em sua essência é escolhida para se revestir da plenitude de Deus.

Tal compreensão se bem compreendida nos leva a conseqüências fantásticas.

  1.  Em primeiro lugar a Igreja como sonho de Deus demonstra ser em sua essência uma realidade da Trindade e na Trindade. Ela brota do coração do Pai, vem ao mundo mediante o Filho e é sustentada na vida do Espírito Santo.
  2. Como realidade trinitária a Igreja é chamada a ser Theophora – portadora de Deus. Enviada no meio do mundo, ela é impulsionada pela força do Espírito Santo a se instalar no coração do mundo. E isso se dá em cada cristão que rompendo as forças do isolamento do eu se coloca em processo da comunhão de um nós, geradora do sentido de comunidade, portanto comunidade “pneumatophara” (portadora do Espírito), para se tornar ao mesmo tempo “eclesiofanica” – manifestadora da Igreja – que irradia, deste modo, no seio do mundo, a semelhança entre seu próprio ser (pessoa-Igreja) e o Deus Trindade.
  3. Os traços dessa Igreja deixam suas marcas na dimensão escatológica de um desejo que se renova a cada dia e de uma realidade que ela vivência em cada Eucaristia. O desejo faz com que ela se compreenda em sua dimensão de peregrina. Ela ainda não vive em sua plenitude. Está se desenvolvendo na história, mas já goza os dons da eternidade. Ela não se polariza, enquanto dom trinitário e nem corre o risco de cair em uma visão dualista, que a esfacelaria por completo. A realidade trinitária garante a ela uma estabilidade interior, que jamais poderá ser rompida. È isso que a Igreja oriental chama de uma Igreja como “humanidade em vias de “trinitarização”, e o universo em vias de transfiguração”. Neste sentido, vale lembrar que a Igreja tem sua essência e conteúdo em Deus, é nele e dele que ela tira sua força e a razão de seu existir.

Deste modo podemos perceber que a Igreja não se faz. Ela não tem o poder de se plasmar. Ela é dom enquanto se compreende na dinâmica de exitus et reditus, saída e retorno a Deus. Abandonar esta visão seria esvaziar a Igreja de seu alicerce. Dispensá-la de sua verdade. O prejuízo seria fatal. Ela perderia por completo sua raiz e assim cairia na total inconsistência.

De outro lado, se considerarmos este aspecto trinitário, sem isolá-lo da história, nos enriquece porque nos faz ver que a Igreja, enquanto realidade personficada pela Trindade, possui um centro de gravidade interior onde se estabelece sua existência no mundo: liberdade de ação, capacidade de escuta, abertura e diálogo incessante, grandezas e misérias.

Assim a Trindade passa a ser, paradoxalmente, os limites de possibilidade da própria Igreja. A Trindade a limita enquanto é a única fonte da Igreja, sua origem e consistência, seu único grande critério de discernimento. Fora da Trindade a Igreja não existe. Mas de outro lado a Trindade é a possibilidade de abertura ao infinito para e da Igreja. Na Trindade, a Igreja vê seu horizonte se ampliar, diante de si se estende ao infinito seu futuro e se aproxima ao máximo o Deus do futuro e o Futuro de Deus. Por isso a Igreja, em Cristo passa a ser o sonho de Deus Pai realizado e consumado.

 6.     Alegoria: uma tentativa de interpretação cristã de sua própria vivência

Dizei-me, vós que quereis sujeitar-vos à Lei: não ouvis o que diz a Lei? Com efeito, está escrito que Abraão teve dois filhos, um da escrava e outro da livre. Mas o filho da escrava nasceu segundo a carne, e o filho da livre nasceu em virtude da promessa. Esses fatos têm um sentido alegórico, pois essas mulheres representam as duas alianças. A primeira, Agar, que vem do monte Sinai, gera filhos para a escravidão: Agar representa o monte Sinai, que se encontra na Arábia, mas corresponde à Jerusalém atual, que é escrava com os seus filhos. A Jerusalém do alto, ao contrário, é livre; e é a nossa mãe. Pois está escrito:“Rejubila, estéril, que não dás à luz, prorrompe em gritos de alegria, tu que não sentes as dores do parto, porque os filhos da mulher abandonada são mais numerosos do que os da mulher que tem marido”. E vós, irmãos, como Isaac, sois filhos da promessa. Mas, como naquele tempo o filho segundo a carne perseguia o filho segundo o espírito, assim acontece também agora. Entretanto, que diz a Escritura? “Expulsa a escrava e seu filho, pois de modo algum o filho da escrava será herdeiro, junto com o filho da livre”. Portanto, irmãos, não somos filhos de uma escrava; somos filhos da mulher livre (Gl ,21-30).

Acima vimos que são Paulo usa um termo grego muito importante para as primeiras gerações cristãs. O termo é alegoria. Esta era uma forma muito usada pelos rabinos do tempo de Paulo. Ela traçava um método de comparação entre os fatos e seu sentido. De tal modo que a própria escritura se tornava interprete de si mesma. Lêem-se as Escrituras em seu próprio espírito. Para nós, seria hoje uma forma metafórica de ler as coisas, os fatos. A metáfora continua sendo o melhor método de unir o conceito à realidade. Pois de um âmbito ao outro, do conceito ao fato, existe uma vazio intransponível. É necessário algo que preencha este vazio. Era assim que os judeus, e também hoje com a exegese científica, busca-se elucidar melhor o sentido dos próprios textos. As alegorias nos permitem ver que os textos bíblicos não são “fatos brutos”. Mas frutos de uma corrente ininterrupta de interpretação da própria realidade da fé. O ambiente vital das Escrituras supõe uma visão de mundo muito distante da nossa. Os textos do Gênesis nos remetem diretamente a uma imagem mítica do mundo antigo. A intenção teológica do autor bíblico não era a de narrar cientificamente a criação, mas de tecer a criação a partir de um fio condutor que lhe dava sentido e consistência.

Foi nesse sentido, que na Idade Média, os teólogos escolásticos desenvolveram um método espiritual de leitura bíblica, que implicava quatro passos fundamentais, na qual se permitia uma leitura mais popular e escolástica da doutrina contida nas Escrituras e que permitia ver o fio condutor dos sentidos das Sagradas Escrituras.

Esse método fundamentava-se no famoso dístico do teólogo Nicolau de Lira, que em 1330 faz referência a este dístico na sua famosa Apostila da carta de São Paulo aos Galatas. Eis o dístico:

  1. Littera gesta docet, quid credas allegoria;
  2. Moralis quid agas, quod tendas anagogia![1]

O dístico era uma tentativa de busca da inteligência da fé para compreender o alcance das verdades presentes na Escritura. Podemos então traduzir assim o dístico:

  1. A letra ensina e manifesta os gestos (ações); a alegoria conduz à fé;
  2. A moral revela como se deve agir; e anagogia manifesta aquilo que devemos esperar!

Aplicando tal dístico à realidade da Igreja, os primeiros cristãos encontram nas Escrituras um terreno seguro e familiar. Neste método de leitura, as Escrituras são comparada a um rio, sobre o qual se constrói a Igreja, a cidade de Deus.

Tal método permitia aos primeiros escritores do Novo Testamento distinguirem entre “imagem” e “significado”, entre “modo de exprimir-se” e “conteúdo do enunciado”. Estavam postas as bases para uma compreensão da própria realidade vivida à luz de Cristo, chave de leitura de toda a Escritura.

É neste sentido, que todas as palavras e gestos de Jesus, seu anúncio sobre o Reino de Deus devem também hoje ser traduzidos da situação daquela época e da imagem mítica que se fazia do mundo, para a nossa situação atual e para a nossa imagem moderna de mundo. Este processo se chama na linguagem dos estudiosos, o processo de “demitologização”. Este processo permite aos exegetas, estudiosos e cientistas da bíblia, de despirem as vestes dos textos e assim penetrarem no significado e conteúdo que são os elementos perenes e sempre válidos da Escritura.

A própria pregação do Reino de Deus, centro da vida e da mensagem de Jesus, e, portanto, fundamento da Igreja, não pode incluir a pregação da imagem do mundo própria da antiguidade, se ainda quisermos levar a sério os ouvintes da Palavra, que são os nossos contemporâneos hoje. É isso que Paulo faz acima. Usa um texto concreto, um fato histórico (Lettera gesta docet) e o transpõe de uma nova maneira aos seus contemporâneos. Lucas usará a imagem de Pentecostes do Êxodo (Ex 19), para descrever a nova situação da Igreja que nasce no dia de Pentecostes (At 2). É isso que podemos entender com a exortação que Jesus faz aos fariseus de seu tempo: “Quem tiver ouvidos para ouvir, ouça, quem for capaz de compreender, compreenda”. Neste sentido, tanto as imagens da criação (protologia), quanto as imagens do “fim dos tempos” (escatologia) entram no crivo da demitologização, não no sentido de desprestigiar a fé, ou de miná-la em sua essência, mas como forma de transpor as barreiras da linguagem passada e das imagens míticas, para uma compreensão atualizada da Palavra de Deus.

Assim como os textos da Criação não são uma narração literal das coisas feitas sobre os primeiros eventos do mundo; também a escatologia, a realidade do fim escatológico, não é uma narração antecipada dos acontecimentos que irão suceder mais tarde. Neste sentido, a realidade apocalíptica descrita no Novo Testamento, não tem a intenção de descrever o processo cientifico do fim do mundo, mas quer anunciar a consumação definitiva e única que se realizará no fim dos tempos, manifestando assim a revelação do reino de Deus como evento que supera a nossa compreensão e que não se pode realizar senão com a própria força de Deus.[2]

Assim, a leitura alegórica hoje pode nos fornecer um bom subsídio para adentrarmos no terreno das Escrituras e deste modo conhecer melhor e meditar com o coração o mistério da Igreja. A Igreja compreendida como dom de Deus, tem suas raízes já presentes no povo eleito. Ela tira seus traços e fisionomias principais dos acontecimentos realizados em Israel. Podemos parafrasear Sto. Agostinho: “Vetus latet Novo, et Novum patet Vetero” – “O Antigo Testamento esconde a realidade da Igreja em seu núcleo, o Novo Testamento manifesta de forma plena  e definitiva, aquilo que estava escondido na Primeira Aliança”.

 7.     A Igreja prefigurada na Criação

O livro do Genesis testemunha a presença do Espírito de Deus presente na Criação. O Espírito é a Ruah de Deus, a sua presença na Criação. Trata-se de um princípio de fecundidade, traços da sabedoria divina que fecunda a terra. Esta mesma Ruah plasma o barro, molda a terra e forma a humanidade. Aqui já temos, em núcleo, o mistério da Igreja, prefigurada na criação. Ela será a esposa, a companheira compatível tirada do lado de Adão (terra) para ser posta ao lado de Adão. Este fato lido à luz da vida-morte e ressurreição de Cristo se cumpre, no Evangelho de João, no momento da Cruz! A base teológica já está posta no livro do Genesis. O evangelista S. João vê neste fato a própria realidade da Igreja que nasce da Cruz e que se realiza e consuma-se na pessoa de Maria, seio fecundo do Espírito Santo e figura realizada da Igreja de todos os tempos:

  1. Junto à cruz de Jesus, estavam de pé sua mãe e a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas, e Maria Madalena. Jesus, ao ver sua mãe e, ao lado dela, o discípulo que ele amava, disse à mãe: “Mulher, eis o teu filho!” Depois disse ao discípulo: “Eis a tua mãe!” A partir daquela hora, o discípulo a acolheu no que era seu.
  2. Era o dia de preparação do sábado, e este seria solene. Para que os corpos não ficassem na cruz no sábado, os judeus pediram a Pilatos que mandasse quebrar as pernas dos crucificados e os tirasse da cruz. Os soldados foram e quebraram as pernas, primeiro a um dos crucificados com ele e depois ao outro. Chegando a Jesus, viram que estava morto. Por isso, não lhe quebraram as pernas, mas um soldado golpeou-lhe o lado com uma lança, e imediatamente saiu sangue e água. (Aquele que viu dá testemunho, e o seu testemunho é verdadeiro; ele sabe que fala a verdade, para que vós, também, acrediteis.) Isto aconteceu para que se cumprisse a Escritura que diz: “Não quebrarão nenhum dos seus ossos”. E um outro texto da Escritura diz: “Olharão para aquele que traspassaram”.
  3. No lugar onde Jesus foi crucificado havia um jardim e, no jardim, um túmulo novo, onde ninguém tinha sido ainda sepultado. Por ser dia de preparação para os judeus, e como o túmulo estava perto, foi lá que eles colocaram Jesus. (Jó 19, 25-27; 31-37; 41-42)

Podemos aqui aludir a presença da Igreja prefigurada na Criação de várias formas, o Antigo Testamento traz muitos exemplos. A figura do justo Henoc, de Noé e de Melquisedec, figuras importantes do povo pagão, mas que mostra a realidade da Igreja já presente em todas as raças, tribos, línguas e nações. Mateus vai fazer alusão a isso na figura dos Magos do Oriente, que souberam acolher a salvação de Deus em Jesus Cristo. Eles tinham como guia a Estrela, alusão clara da espiritualidade pagã do Oriente! Cristo substitui tal imagem por ser Ele mesmo o “Sol definitivo”!

Os exemplos se multiplicam, a imagem da Igreja não estará acabada e completa enquanto a humanidade inteira não for salva e não fizer parte do festim de Deus. De certa forma, a humanidade já participa deste evento salvífico, ainda de forma implícita e não consciente, pois Deus criou toda humanidade orientada para Cristo, e ela só encontrará sua plena realização quando nele encontrar seu conteúdo tão desejado e perseguido por meio de uma consciência reta, de uma busca sincera da verdade e por uma disposição interior de abertura a Deus, experimentada de diversos modos pelos diferentes povos do mundo, é isso que o grande teólogo jesuíta Karl Rahner quis exprimir com o conceito magistral dos “cristãos anônimos”, expressando assim que a salvação de Cristo é universal, toca a todos, a todos alcança e se torna o conteúdo central do amor aos pequenos, do serviço aos pobres, da assistência aos prisioneiros, realçando o perene valor da parábola do juízo final de Mt 25.

 8.     A Igreja antecipada em Israel

Aqui já adentramos no terreno propriamente cristão da Igreja. O povo de Deus, Israel, é a imagem antecipada e não completa do sonho de Deus. Todos os fatos, instituições, eventos de salvação são de certa forma antecipação da realidade da Igreja. A Igreja se enxerga como herdeira autêntica de Israel, isso implica reconhecer que Israel já é de certa forma a Igreja implícita.

  1. O chamado de Abraão, pai de todos os povos, alude à chamada e convocação universal de Deus de toda a humanidade. Temos nele uma eleição, a iniciativa é totalmente divina, aqui está presente a figura da eleição da Igreja, ela não se faz, ela é também eleita, destinada a todos os povos. Sua missão transcende e supera sua realidade histórica.
  2. Acima São Paulo deu exemplo de Sara e de Agar. Ele já nos fez a interpretação.
  3. Jacó teve doze filhos. Estes constituíram as doze tribos de Israel, símbolo de todo povo eleito. Estas doze tribos são figuras dos doze apóstolos de Jesus, antecipação da Igreja de todos os povos, raças, tribos e nações, como vai cantar o livro do Apocalipse. O Apocalipse usa a imagem da soma das doze tribos e dos doze apóstolos e multiplica por mil, figura que agora representa a humanidade em sua totalidade e plenitude, simbolizada pelo número mil: 12×12 = 144; 144 x 1000 = 144.000.
  4. Moisés é responsável e representante do povo diante de Deus. É ele quem forma o povo de Deus em torno da Palavra (Ex19). Com ele se inicia as instituições em Israel: profetas, sacerdotes. Ele é responsável pela travessia e pela libertação do povo da opressão do Egito. Ele organiza as tribos de Israel. Institui o repouso sabático. Oficializa o serviço do templo. Separa a tribo de Levi para cuidar do santuário de Deus. Aqui teremos o grande símbolo da Igreja como povo de Deus, como shekina, morada do altíssimo. Jesus é o novo Moisés. É ele quem institui e cria a Igreja. Vem para “reunir o rebanho que estava disperso”. Convida os doze, como forma de manifestar o novo povo que está se formando de seu chamado. Muda o nome de Pedro, sinal do encargo que lhe vai confiar. Dá uma missão especifica aos doze: ir ao mundo e evangelizar. Não mais com a lei inscrita em tábuas de pedra, mas com a Nova Lei inscrita pelo “dedo de Deus”, o Espírito Santo, através do Batismo (Mt 28).
  5. O Sacerdócio: As instituições de Israel também prefiguram a imagem da Igreja. O sacerdócio da tribo de Levi será re-atualizado pela carta aos Hebreus na única pessoa de Jesus, o único Sumo e Eterno Sacerdote. Todo povo cristão será uma “nação sacerdotal”. Cada batizado terá a força de falar com Deus como seu Abba. Eles poderão se oferecer, pela força do Espírito Santo, como “hóstia viva, santa e agradável a Deus”. Ao interno desse povo haverá sempre espaço para a ação fecunda do Espírito Santo, que criará sempre ministério e carismas, com a finalidade de construir a Igreja, casa de Deus. Tais carismas e ministérios (episcopado, presbiterado e diaconato) não estarão acima do povo e nem se poderão colocar contra o povo, mas sua finalidade única de ser é estar a serviço desse povo.
  6. A realeza: Saul foi o primeiro rei de Israel. A partir dele, começa em Israel esta instituição própria do mundo pagão. Israel era povo de camponês, viva como semi-nomades. A partir de agora se faz presente a realeza como forma de governo. O Novo Testamento assumirá a realeza como uma instituição de todo o novo povo. Será o papel da liderança-serviço que se estabelecerá ao interno das comunidades cristãs. Todo o povo de batizados vai constituir uma realeza do Senhor. Será uma “nação de reis”. Ninguém está acima de ninguém. Ninguém pode se por contra ninguém: “Os chefes das nações as oprimem, os poderosos as destroem, mas entre vós não deve ser assim”. “Se eu vosso mestre e senhor, vossos pés hoje lavei, lavai os pés uns dos outros, eis a lição que vos dei”. “Quem quiser ser o primeiro, seja o último”. “Eu não vim para ser servido, mas para servir, isto é dar a vida”. Eis a gramática da realeza da nova aliança deixada por Cristo. Como dizia um axioma antigo: “Servir a Deus é reinar”, hoje sabemos como se serve a Deus, servindo e amando aos irmãos, sobretudo, os mais pequenos e pobres, segundo a lógica de Jesus rei-servo.
  7. A Profecia: O profetismo era também um dom muito presente em Israel. Sua existência era uma forma de renovação da aliança. Às vezes acontecia de forma esporádica, outras vezes era transmitida de pai para filhos. Teve período que o profetismo se tornou uma instituição forte no seio de Israel. Profetas e filhos de profetas. Este fato abriu espaço para compreendermos a natureza profética da Igreja. Toda Igreja, em Cristo, participa do ministério profético. Aqui entra o caráter de anúncio e denúncia. Anúncio da graça e da bondade de Deus, como amor aos pecadores e ministério de reconciliação. A denúncia é o caráter de discernimento que busca ver as situações de injustiças e pecados, que aprisionam os seres humanos e os marginalizam da vida e de Deus.

9.     A Igreja realizada na Plenitude dos Tempos

A Igreja nasce como memória viva da presença de Cristo. Recordar Jesus é dar espaço à sua presença. Esta presença é vivenciada de diversas formas. Cada comunidade aprofunda uma imagem de Jesus. Assim fecunda-se um pluralismo de imagens! Mas Jesus de Nazaré se apresenta ao homem de seu tempo e de hoje como mistério santo, mistério inesgotável, que não podemos reduzir e nem capturar em imagens fechadas. Também no Novo Testamento uma imagem surge como corretivo e ampliação de outras imagens. Nenhuma imagem é capaz de fechar e completar o quadro de toda a novidade trazida em Cristo. Perceber isso não é relativizar o dado bíblico-dogmático, mas evidenciar o espaço amplo da teologia, da espiritualidade, da catequese, da liturgia e também de todas as ciências sagradas, na contínua penetração do mistério.[3]

Assim Jesus vem reconhecido e confessado pelos seus discípulos como aquele que se revelou para unir os filhos de Deus dispersos: a humanidade inteira. Neste sentido, eles o reconhecem como: o messias (o rei consagrado, o Cristo, nome mais tarde acrescentado ao nome Jesus para formar uma dupla), o Filho de Deus, que desce do céu, o Filho de Davi, o servidor e o Kyrios (especialmente no mundo helenístico), o Senhor!

Com a profissão de fé, uma nova comunidade se torna agora realidade. A profissão de fé serve como lareira ao redor da qual os discípulos se sentem chamados a se reunir para lembrar a memória do mestre Jesus (eucaristein). A experiência desta nova comunidade è para os discípulos motivo de alegria e gratidão. Os discípulos celebram a ceia comum, realizam a “fração do pão” em total “jubilo” (At 2,42-47). Deste modo, a nova comunidade sente realizar em si as promessas vétero-testamentária. Tudo é visto em chave escatológica, as coisas antigas se passaram. Realizaram as antigas profecias, o fim dos tempos se aproximou como dom, como presença, como Parusia do Senhor ressuscitado! “Ele está vivo, em meio a nós”! Cada eucaristia celebrada é oportunidade de se encontrar com o Senhor. O fim dos tempos é marcado pelo derramamento do Espírito Santo. É ele quem torna presente o Cristo vivo. Esse mesmo Espírito, segundo a concepção judaica, havia se distanciado de Israel desde os tempos dos últimos profetas, mas agora, na plenitude dos tempos ele foi derramado por Deus na nova comunidade de muitas maneiras: nos novos profetas, no dom das línguas e nos poderes extraordinários, na agudes das palavras diante dos tribunais. Para viver a experiência deste Espírito messiânico é necessário a passagem pelas águas do batismo, é preciso ser mergulhado no mistério trinitário. É assim que desde o início se usa o batismo como rito de aceitação na nova comunidade: rito prefigurado no profeta Jonas, banho que atesta a purificação e a conversão das culpas em vista do reino de Deus que vem.

Deste modo a comunidade cristã se torna comunidade de salvação dos últimos tempos. A volta de Jesus dentre os mortos torna-se o evento absolutamente decisivo da comunidade cristã. O que Deus realizou nele de forma única e definitiva se torna promessa e profecia das coisas futuras. O futuro de Deus se tornou tangível, palpável.

É deste modo que a comunidade dos discípulos se reconhecem como Igreja realizada, convocada e escolhida por Deus para o fim dos tempos. Vai se multiplicar, sobretudo, nas comunidades paulinas, várias denominações escatológicas: os eleitos (exlextoi); os santos (agioi). Esses formam a comunidade dos santos, dos escolhidos, dos eleitos. São todos eles laicos (Laos + ico Theou) povo pertencente ao Senhor. Recebem cidadania na comunidade definitiva. Sinal desta cidadania é que não existe necessitados entre eles. O vínculo da solidariedade lhes caracteriza como sinal externo e testemunho do amor de Deus. Assim podem a bom direito assumir o nome da comunidade de Deus do Antigo Testamento, e, ao mesmo tempo, se ressalta a novidade escatológica de sua identidade: eles são a Kahal Yahwe, “a comunidade de Deus”.

 10.           Definição da Qahal Yahwe – Ekklesia tou Theou

A palavra grega que traduz essa novidade da comunidade escatológica de Deus, que deve se manifestar por meio da reunião de todo Israel, é a palavra ‘Ekklesia tou Theou’, assembléia de Deus, hoje brevemente traduzida por Igreja.

A palavra Igreja se revelou desde cedo muito ambígua e complexa. Foi um processo lento a escolha e a passagem para se definir como ekklesia tou Theou. Os evangelhos são bem comedidos em usar esta expressão (Mt 16  e 18).

 11.           Natureza da Ekklesia tou Theou

A palavra Ekklesia era uma palavra de uso profano. Para a tradição grega política, simbolizava a vida do cidadão grego, aquele que gozava de plenos direitos cívicos, em contraposição aos ethnos (estrangeiros) e escravos. Somente o cidadão grego gozava do titulo ek-kletooi, isto é: os chamados e convocados pelo arauto. A Ekklesia é, portanto, isso que vem ‘convocado, chamado’; é a reunião dos convocados: a assembléia do povo. Em sentido próprio, Ekklesia significa assembléia política. Por isso que Ekklesia designa o efetivo reunir-se do povo. Um ato, simultaneamente, convocativo e ativo para então se tornar deliberativo. Os convocados são os que se constituem a ordem cívica do Estado. Fica manifesta, portanto, uma clara diferença de significado entre Ekklesia grega e a Ekklesia do Novo Testamento.

Para o Novo Testamento o conceito de Ekklesia não é uma derivação direta do termo grego profano. O que vai determinar o uso da palavra no Novo Testamento será o uso que os Setentas[4] faz em sua tradução grega da bíblia judaica. Nos Setentas a palavra aparece cerca de 100 vezes, quase sempre para traduzir o termo hebraico, em si profano, de qahal = assembléia convocada. Que se diferencia de eda = assembléia popular com especificação jurídica e cultual, muitas vezes traduzida para o grego com o termo sunagogé.  O que definirá o caráter propriamente hebraico da palavra Ekklesia é o acréscimo do genitivo ‘do Senhor’.

Esta palavra como vimos acima percorre um caminho complexo e ambíguo para expressar a realidade da comunidade escatológica de Deus. Ela traz uma conotação ativa e passiva. O povo que se reúne para tomar decisões e o povo que é reunido. No nosso caso, ainda que não se esqueça o caráter de reunir-se, o que será determinante não é que algo se reúne, mas “quem reúne”. A tonica recai sobre o sujeito que convoca e reúne. É Deus quem convoca e a Ekklesia torna-se assim uma assembléia, uma comunidade de Deus. Não se trata mais de uma reunião qualquer com homens quaisquer. A Ekkesia de Deus é muito mais que o simples efetuar-se de uma reunião, ela é a assembléia que se reúne ao redor de Deus como seu centro.

 12.   O sentido de Ekkesia como expressão da Igreja Particular e Universal

O termo ekklesia no Novo Testamento serviu de base para três conotações de caráter particular para a compreensão da única Igreja de Jesus Cristo: O primeiro sentido, aquele que é o mais próximo do que temos hoje é o sentido cultual, assembléia celebrativa, assembléias litúrgicas e eucaristicas. Onde se celebra a eucaristia ali se faz presente a Igreja (assembléia) de Cristo.

Um segundo sentido de ekklesia caracteriza a localidade da Igreja, sua particularidade. Geralmente a Igreja tem um lugar especifico, uma fisionomia própria. Assim Paulo usa o termo para designar as comunidades por ele fundadas Ekklesia de Corinto, Ekklesia de Tessalonica, Igreja de Laudicéia.

Já a última e também a mais forte e mais elaborada teologicamente falando noção de Igreja é aquela de ekklesia universal. Igreja universal, a única Igreja de Cristo espalhado por todos os cantos da terra.

Assim ao assumir a qualificação de Ekklesia a comunidade primitiva rele sua própria história como sendo a verdadeira assembléia de Deus, a verdadeira comunidade de Deus, o verdadeiro povo escatológico (definitivo, último). Esta palavra falta nos evangelhos, com exceção de Mt 16,18; 18,7. Algumas cartas paulinas também não fazem nenhuma referência a ela como Tit; 2Tim e Jd; mas podemos encontra-la em 1Tm 3,5.15; 5,16. A 1 e 2 carta de João também não a utiliza, mas já aparece em 3Jo 6,9s. Também não a encontramos em 1 e 2 Pd, mas podemos todavia ver os equivalentes em 1Pd 2,9ss. Apesar desta falta, o termo Ekklesia assume grande importância em Atos dos Apóstolos e Paulo.

a)      Nos Atos dos Apóstolos: ao início se fala da Igreja (Ekklesia) de Jerusalém (At 5,11; 8,1.3); já em At 7,38 usa-se o termo fazendo referência ao povo de Israel no deserto. Depois se usa Ekklesia para especificar a presença da comunidade cristã em toda a Judeia, Galiléia, Samaria (9,31).

b)      É interessante que em Samaria, alguns textos trazem Ekklesia ao plural (15,41; 16,5). Saindo do terreno da Palestina, começa a se falar da Ekklesia de Antioquia, aquela de Cesareia e de Efeso (20,28). Trata-se sempre da própria auto-consciência que a comunidade começa a assumir como Ekklesia de Deus, pois é Deus quem reúne os seus (20,28)

c)      Também são Paulo fala usa o termo em diversos contextos no plural (1Cor11,16; 14,33; 2Cor 8,18; 11,8; 12,13; Gl 1,2.22; Rm 16,4.16).Singular e plural se alternam muitas vezes.

d)     O próprio lugar da Igreja é muitas vezes nomeado. Frequentemente é sempre uma cidade: Tessalonica (1Ts 1,1; 2Ts 1,1); Corinto (1Cor 1,2; 2Cor 1,1); Cencréia (Rm 16,1); Laodicéia (Cl 4,16);

e)      Paulo utiliza ekkesia para designar também regiões: Asia (1Cor 16,19); Galacia (1Cor 16,1; Gl 1,2); Macedonia (2Cor 8,1); Judeia (Gl 1,22; 1Ts 2,14).

f)       Mas também a pequena comunidade domestica pode ser chamada de Igreja por Paulo (Rm 16,5; Fil 2; Col 4,15.

g)      Existe também a conotação cultual do termo. Essa será o sentido mais forte da palavra ekklesia, entendendo Ekklesia expressamente como comunidade reunida para o serviço divino (1Cor 11,18; 14,23-24). É daqui que nasce a compreensão da Igreja que nasce da Eucaristia, como foi bem retratada no documento Ecclesia de Eucaristia do Papa João Paulo II.

h)      Pode servir para designar a convivência de fato, que se realiza entre os cristãos (1Cor 11,18.20.33; 5,14-23.26).

i)        Caráter Universal da Ekklesia: somente na carta aos Efesios considera a igreja universal em um sentido novo, especialmente em relação à única Igreja feita de judeus e pagãos (Ef 5; 1Cor 12,28).

13.   Igreja e seu significado cultual, assembléia eucarística

A palavra ekklesia significa, enquanto assembléia, o efetivo e concreto reunir-se e ao mesmo tempo a comunidade reunida. Não podemos abandonar nenhum dos significados. A Igreja não existe pelo simples fato de que ela foi fundado, como entidade autônoma e independente. Ela existe pelo fato de que continuamente, sem interrupção, torna-se a reunir-se efetivamente, como assembléia cultual-eucarística. Este efetivo reunir-se é a manifestação atual da comunidade do Novo Testamento que se realiza a cada eucaristia celebrada. E o Novo Testamento existe para atestar a vivência desta comunidade reunida.

 14.  O Sentido dinâmico e relacional da Ekklesia   

‘Assembléia’, ‘igreja’, ‘comunidade’ não são termos que se opõem entre si, mas realidade assumida pelo próprio Novo Testamento expresso pela única palavra ekklesia. Não devemos hoje criar oposições entre elas, mas vela em sua profunda relação. As três palavras não fazem concorrência uma a outra, mas se completam mutuamente na tradução do termo Ekklesia que de per si é bastante complexo e rico de significado:

‘Assembléia’ exprime a natureza dinâmica da Igreja, que nunca existe como uma instituição estática, mas somente em virtude do efetivo e continuo encontrar-se juntos. Sublinha deste modo o caráter de evento atual.

‘Comunidade’ sublinha que a Ekklesia não é nunca uma super organização abstrata e distante, que funciona sobre e independente da comunidade de fato reunida. A palavra comunidade manifesta mais claramente o sentido concreto da Ekklesia enquanto comunidade fraterna que se reúne em um lugar especifico, com um rosto determinado e sempre para uma função precisa. Isto traduz portanto a estabilidade da Igreja local.

‘Igreja’ exprime, por sua vez, que a Ekklesia não é uma justaposição inorgânica, uma reunião religiosa isolada, aparte do mundo e auto-suficiente, ao contrário, Igreja manifesta o conjunto dos membros de uma fraternidade acolhedora, reunidos em recíproco serviço, com uma linguagem bem determinada, caracterizando a dimensão mais institucional da Igreja, costumes, normas, disciplinas.

 15.   Ekklesia expressão viva e rosto concreto da Igreja local e Universal

Toda Ekklesia (assembléia, comunidade, igraja) não é na sua particularidade “a Igreja”, mas ela manifesta plenamente a Igreja: para nós católicos isso significa duas coisas.

a)      Primeiro: a Igreja local ou particular não é uma ‘seção’, repartição ou uma província da Igreja de Ekklesia Universal. Esta Igreja não é uma subdivisão da ‘Igreja’ propriamente dita, uma espécie de comarca ou de empresa com suas filiais. Muitas vezes é isso que se compreende na linguagem do dia-a-dia do nosso povo. Neste sentido não é saudável chamar de Igreja somente a Igreja Universal, isso é conseqüência de uma visão abstrata e idealista que se afirmou no último milênio do cristianismo, sobretudo no Ocidente cristão. Esta imagem idealista e abstrata da Igreja dá a impressão de que nossas Igrejas concretas e locais não fossem a Igreja em sua totalidade e plenitude, mas somente uma simples filial. Cada Igreja particular possui a inteira promessa do evangelho e a plenitude da fé. A ela é dada toda a graça do Pai e nela está presente o Cristo inteiro e o Espírito Santo é derramado sobre ela plenamente. Assim podemos dizer que a Igreja local é a Igreja concreta que conhecemos: Igreja de Cuiabá, Igreja de Sinop, Igreja de Cáceres… A Igreja local é realmente Igreja, ela não é uma parte da Igreja, mas a própria Igreja de Jesus Cristo. Somente a partir da Igreja local e de sua concreta realização se pode compreender a Igreja universal. Ela é a realização concreta de salvação para um determinado povo. Possui todos os meios necessários da graça e da salvação, nada lhe falta, ela é completa, pois possui em sua vida: o anúncio do evangelho, o batismo, o banquete do Senhor, os diversos carismas e o multiforme serviço.

b)      Em segundo lugar: ‘a Igreja Universal’ não é uma ‘reunião’ ou ‘associação’ das várias igrejas locais, não se trata de uma soma de cada igreja, onde 1 + 1 = 2 e assim continua até formar a plenitude da Igreja. Para o Novo Testamento as diversas comunidades locais são sempre denominadas com o mesmo nome: Ekklesia. Mas sabemos que, tanto nos Atos dos Apóstolos como nas cartas paulinas, existe um uso do termo Ekkelsia que denota um sentido super-local, ainda que não esteja bem claro o sentido teológico e jurídico que se dá entre as Igrejas locais e a Igreja universal, o que o Novo Testamento nos atesta é que as Igrejas locais tem mais que um nome em comum, mais que um ligame externo, mais que uma dependência orgânica de um organismo superior. Este é o fato que conota a universalidade da Igreja, esse ‘aspecto invisível’ e onipresente da única Igreja de Cristo, na comunhão de todas as Igrejas locais. Uma vez que a todas as comunidades locais é dada um único e mesmo evangelho, a mesma segurança, a mesma promessa. Todas usufruem da mesma graça  do único e mesmo Pai, tem o único e mesmo Senhor,  são movidas pelo único e mesmo Espírito Santo, fonte de todos os carismas e ministérios. Todas professam a única e mesma fé, são santificadas pelo único e mesmo batismo e se nutrem do único e mesmo banquete. Assim todas juntas formam a única e mesma Igreja de Jesus Cristo. Não se trata da soma das Igrejas para produzir a única Igreja. Ela não se subdivide para formar as igrejas locais, mas nas diversas localidades do mundo existe a Ekklesia de Deus. Não existe uma Igreja de Corinto, uma Igreja dos Coríntios, mas “a Igreja de Deus, que está em Corinto” (1Cor 1,2; 2Cor 1,1).

Mas foram as comunidade primitivas (a Igreja) que sentiram a grande necessidade de renovar e revitalizar sua própria memória de Jesus. Por que essa anamnese? “Pelo seguinte motivo: depois de haver pregado o Kyrios durante décadas, a comunidade cristã teve de lutar contra desvios de tipo espiritualista que negligenciavam o Cristo extra nos para só considerar o Cristo intra nos. Diante desse perigo, ao qual faz alusão as epistolas aos Corintios, a Igreja teve de adotar um critério de discernimento. Quem realmente, pode reconhecer com segurança aquele que é verdadeiramente inspirado e fala verdadeiramente em nome de Cristo? Pois o Espírito pode ser manipulado, instrumentalizado. A fim de proteger  a própria pureza do quérigma, a Igreja recorreu às palavras e gestos de Jesus. E

É incrível ver como que pela via científica, a Igreja conseguiu uma serenidade e uma confiança mais sólidas na mensagem dos evangelhos, permitindo-nos encontrar a história autêntica de Jesus. Mas isso se equilibra com o fato que é impossível chegar ao Jesus histórico sem a mediação da fé da comunidade, que Dele fez experiência.

 II.  Jesus e a Igreja: O Jesus confessado e crido pela Igreja

Nossa época foi sacudida pelo forte vento do “preconceito eclesiológico”; hoje, parece que estamos num clima mais sereno, se percebe claramente que não é possível viver uma fé autêntica fora de uma comunidade de fé. O dado cristológico implica uma vivência eclesial, e a ela leva e também dela recebe conteúdo e forma. Já não é mais possível a separação: “Cristo sim, Igreja não!”.

No início do século XX, devido ao clima que se instalou no centro do cristianismo católico, a situação de suspeita, perseguição de teólogos, o incrível medo do modernismo, fez com que muitos assumissem um ar de suspeita em relação a Igreja institucional, ao ver de muitos deles, a Igreja como instituição teria falsificado a mensagem do Nazareno e produzido, conforme as diferentes épocas históricas, uma falsa imagem da Pessoa de Jesus. Estes pensavam então em superar totalmente a tradição da Igreja, considerada neste cenário como obstáculo para se alcançar a vida autêntica de Jesus, estabelecendo desta forma o verdadeiro programa de Jesus Cristo. “antes de ser coberto – afirma Hans Kung – pelos detritos e pela poeira de dois mil anos”.[5]

Precisamos de um ponto de partida que norteie este horizonte da fé em Jesus, e só podemos encontrá-lo nos Evangelhos, onde se manifesta claramente a fé em Jesus Cristo, tal como ele era crido, vivenciado, anunciado e praticado nas Igrejas cristãs. Somente deste modo podemos lançar a ponte que une Cristo à Igreja e que nos tira da insegurança subjetivistas de nossas tendências modernas e assim nos ancora na existência real e concreta de uma comunidade que soube guardar o depósito de sua fé, pois o ambiente de germinação do dado cristológico é a Igreja e como, por outro aspecto, podemos também dizer que o anúncio vivo da pessoa de Jesus é a força plasmadora da própria comunidade eclesial. Neste sentido, podemos afirmar que o ambiente vital dos evangelhos que nos narram a vida de Jesus, suas palavras e ações, é a própria Igreja. O padre Belga E. Schillebeeckx confirma isso quando diz que: “Na origem do cristianismo não estão nem Jesus nem a primitiva comunidade eclesiástica separadamente, mas ambos, como oferta e resposta. Não há cristianismo sem Jesus, mas tampouco sem cristãos!”.[6]

Esta dimensão bíblica da Igreja assumida pelo Concílio equilibrou cristologia (Dei Verbum) e eclesiologia (Lumen Gentium), que nos permitiu desenvolver uma maneira de entender a Igreja não mais como o ponto central da revelação, tendência que facilmente caia nas tentações eclesiocêntricas, que acabava mais escondendo que desvelando o verdadeiro rosto de Jesus Cristo. Para uma equilibrada visão cristológica da Igreja, onde as comunidades eclesiais constituíram e continuam a constituir o ambiente vital (Sitz in Leben) original da formulação da reflexão cristológica. É deste modo que podemos compreender a “inclusão recíproca”( E. Schillebeeckx) entre a pessoa de Jesus Cristo e a comunidade crente, onde o “prisma da resposta cristológica” da comunidade de fé é sem dúvida nenhuma o lugar da compreensão do verdadeiro rosto de Jesus e o ponto de partida da cristologia e também da própria eclesiologia. Neste sentido, a fé da Igreja da era apostólica, se torna, embora normatizada pela palavra de Cristo, critério da interpretação, caminho necessário para chegar à mais profunda e autorizada compreensão do rosto autêntico de Jesus.

É necessário, neste sentido, ver o profundo nexo que liga o acontecimento histórico da revelação que se manifesta em toda sua plenitude em Jesus de Nazaré, com a atualização completa deste acontecimento que só se realiza na fé da Igreja de todos os tempos, tendo como norma e princípio interpretativo a Igreja da era dos Apóstolos (que se estabelece como norma normans non normata do constituir-se da Palavra). Agora o que ocorre no período posterior aos apóstolos ilumina a nossa época, nos ajuda também em nosso processo de aprofundamento das respostas que devemos hoje elaborar do sentido de fé, pois esta era pós-apostólica procede a um contínuo aprofundamento interior do evento Cristo, a elas transmitido por meio do anúncio das Igrejas apostólicas e pelo dom do Espírito Santo, que constitui a possibilidade da resposta de fé à Palavra! O Espírito é agora o principium formale quo da força plasmadora da Igreja e da resposta de fé que esta faz ao anúncio de Jesus.

É por isso que a cristologia é sempre mediada pelos diversos prismas representados pelas diversas cristologias. Foi o que se deu no interior do Novo Testamento, na Tradição, pela qual “a unidade e a simplicidade do dogma cristológico requerem, para a sua conservação, uma pluralidade de cristologias que, na fragmentariedade e concretude da realidade histórica, expresse linguisticamente a confissão única”.[7]

Assim a cristologia é na verdade a sempre renovada expressão da pluralidade dos vários modos de entender a figura de Cristo dentro da Igreja, os estilos diferentes de viver a fé das igrejas locais, com toda a riqueza do seu patrimônio de espiritualidade, tradição, sensibilidade de anúncio catequético, pastoral… que visam sempre constituir-se como via de acesso às diversos compreensão do inexaurível mistério de Cristo. É assim que Paulo ia compreendendo e aprofundando as diversas orações, hinos e pregações cristológicas, até ele poder formar sua própria imagem do mistério de Cristo, com uma densidade incrível de modalidades e apreensões deste mesmo mistério.  Podemos então considerar que a vida de fé da Igreja fornece ‘matéria’ de interpretação teológica em todos os seus aspectos. E por sua vez a cristologia representa a consciência crítica do modo pelo qual as comunidades vivem a experiência de Jesus. Isto se dá pelo fato de que a Igreja, que vive defronte a Cristo, como aquele que continuamente a transcende, vive sob a norma Christi, devendo-se deixar continuamente avaliar por ele, para não pesar sobre a Igreja, como nos tempos passados, a hipoteca de uma visão e mentalidade eclesiocêntrica que se deixava avaliar muito pouco pelo anúncio de Jesus Cristo, ou que corria o constante perigo de projetar sobre a figura de Jesus a sua visão particular das coisas, justificando situações inadmissíveis em campo de justiça social e vida eclesial.

A Igreja tem necessidade de sempre se voltar a Jesus Cristo, “evangelizando a si mesma” pois “Contemplar sem escândalo a Igreja è coisa mais árdua que contemplar sem escândalo o Cristo. Que profunda purificação e transformação do olhar esta exige! E como será necessário, para conseguir uma suficiente inteligência do seu mistério, «rejeitar qualquer obscuridade dos pensamentos terrenos e cada fumaça da sabedoria mundana!»[8]

A Igreja em sua natureza mais profunda é chamada a “se transformar”, isto é, deixar-se conduzir à sua vocação última, à transfiguração de sua essência. Aqui está condensada toda a perspectiva escatológica da visão crista, que não pode se degradar em nenhuma visão utópica, sobretudo, daquela visão revestida de sabor integrista, que nunca será conatural à natureza católica da Igreja.

É interessante, neste sentido, a sabedoria de Carlo Carreto quando define a conversão como uma forma autêntica de Igreja, assim diz ele:

O primeiro sinal de conversão com o qual se demonstra que temos compreendido o que é a Igreja, é aquele de não considerar a Igreja somente o Vaticano ou a diocese, mas cada um de nós. Que força não derivaria daí se todos os cristãos repetissem «Eu sou Igreja». E se cada um trouxesse um contributo à ação do bispo dizendo: toca a mim[9].

Porém, pode ser que se insinue em alguns uma visão distorcida da Igreja, uma ilusão triunfalista em relação à Igreja, onde «preocupados de valorizar o seu organismo visível» o que na verdade é somente instituição ou meio de graça, alguns chegam ao ponto, por exemplo, de fazer do culto sacramental «uma espécie de fim em si mesma»[10].

Este são custosos em admitir que no dia do seu triunfo a Igreja abandone «o seu revestimento histórico e mortal, ou seja, todo aquele aspecto de si mesma para qual esta é atualmente… o instrumento do próprio crescimento e é solidaria com a condição terrena dos seus membros»[11].

Para melhor esclarecer, estes ideólogos eclesiásticos chegam a consolidar a autoridade daqueles que são na Igreja os representantes de Cristo e sucessores dos Apóstolos, de uma forma absoluta, chegando ao ponto extremo de querer eternizar de certo modo, não somente – como é justo – o sinal sagrado do “caráter” que estes receberam, mas, em uma forma que estes mesmos não estão em grau de precisar, também o exercício de seu poder.[12]

Por isso K. Barth nos alertava já: “A Igreja não pertence a si mesma, mas a Ele. Não vive de si mesma e para si mesma, mas somente porque ele é a sua razão de ser e enquanto ele vive e ai é a cabeça, enquanto esta, com seus membros, é ai o corpo. A Igreja esta aos pés do Senhor e o serve. Não pode querer outra coisa, pois sua razão de ser está em satisfazê-lo. Não conhece potência  e magnificência, fora daquela que existe nele. Não quer que exista outra coisa senão ele mesmo e, também se o quisesse, não o poderia. É assim humilde a verdadeira Igreja, que tem tudo somente nele; e é ao mesmo tempo plena de majestade, porque tudo possui nele[13].

III.  Jesus – Proposta de possibilidade das reconstruções dos vínculos comunitários

Acima acenamos um pouco de nosso cenário plural, cheio de imagens da pessoa de Jesus Cristo e conseqüentemente de sua Igreja, comunidade de amor. Jesus e a Igreja são realidades que se implicam mutuamente. São inseparáveis. Ambos são geradoras de imagens e de modelos. Muitas delas válidas, mas limitadas. É sempre necessário alargar o horizonte, refazê-lo à luz da tradição e das experiências do cotidiano de nosso povo. Quando nos dispomos a isso, também nos dispomos a reencontrar nosso lugar na comunidade de fé, e redescobrir o lugar que Jesus Cristo tem nesta comunidade.

Tal percepção nos conduz a uma nova consciência missionária, à necessidade de um cotidiano evangelizador. Vemos que nossas comunidades precisam fazer opções urgentes nesse novo cenário. Isto implica em perceber que o novo cenário mudou também a forma de conceber a realidade, a mentalidade atual não repousa mais sobre pressupostos fixos. Ela se acenta sobre uma perspectiva em mutação, em contínua transformação e oscilação. Neste sentido o perfil do novo evangelizador (o fiel não pode estar fechado em si mesmo, a natureza da Igreja exige dele o estado permanente de discipulado e missionaridade), assim cada fiel precisa assumir uma postura muito semelhante àquela de Jesus de Nazaré. Postura de diálogo, de humildade, de respeito ao diferente, de um contínuo e renovado sair de si em busca do outro. Isso nasce da experiência pessoal de Jesus Cristo.

As comunidades então são confrontadas com a pessoa de Jesus, “que sendo rico se fez pobre, para nos enriquecer”. Aqui está a perspectiva assumida por Aparecida e que pode ser a luz sobre as nossas comunidades. Somos comunidades simples, mas isto não impede de sermos comunidades solidárias e fraternas. Podemos arrancar de nossas pobrezas, riquezas espirituais e até materiais capazes de restaurar a vida das pessoas de nossas comunidades.

Redescobrir o rosto de Cristo nos pequeninos nos leva a apropriar-nos do tempo da graça de Deus para nossa sociedade. Isto tornará mais leve nossas incidências na sociedade sempre em contínuo e acelerado processo de mutação. Veremos que neste momento de mudanças, existem ainda fortes eixos norteadores e orientativos: a necessidade do grupo, a busca de ser acolhido e compreendido. A forte característica de possuir a própria liberdade e se descobrir como pessoa com dignidade. Isto nos leva a ver que então temos já uma esperança para o renascer comunitário, mas que deve levar em conta o valor que os sujeitos de hoje redescobriram do desenvolvimento da própria autoconsciência.

Feito esta descoberta descobrimos então que só através de uma experiência pessoal com a Pessoa de Jesus Cristo estaremos prontos para começar uma experiência comunitária de fé; mas não podemos nos esquecer que somente dentro de uma comunidade de fé (que leve em consideração a necessidade que os sujeitos humanos ali presentes tem da experiência pessoal) é capaz de nos possibilitar uma experiência concreta.

Jesus nos leva então a ver o seu ideal de irmãos! De que somos filhos do mesmo Pai, de que algo mais profundo e dinâmico, atuante na história humana, perpassa todas as reais fibras de nossa existência para levar-nos ao sonho de Deus Pai que é nos construir como comunidade de fé, de esperança e amor. Pois comunidade supõe um grupo unido e relacionado por vínculos fortemente pessoais. Isto implica o sentimento de pertença e participação. A esta altura podemos nos perguntar se nossa comunidade, se nossa liderança deixa espaço para uma real compreensão da eclesiologia de comunhão do Concílio Vaticano II? O Concílio em seu documento sobre a Igreja e nos outros documentos acenava a necessidade do leigo nas estruturas, de uma nova compreensão da Igreja como povo de Deus, trata-se de uma imagem mais bíblica e personalista da Igreja, portanto menos burocrática e jurídica. Ela não deixa de ser hierárquica, mas se concebe e se auto-compreende como dinamismo vivo de todos os batizados.

É daqui que podemos tirar conseqüências substanciais para entendermos o sentido de comunidade de fé. O especifico da comunidade é o estado de espírito que a anima, que implica “entendimento compartilhado”, vencendo assim todas as formas de uma “cultura de morte” ao nosso redor da sociedade pós-moderna, viveiro consumista do anonimato, geradora das vítimas da indiferença, e justificadora das situações de exclusão que deixam as pessoas em situações de desespero e miséria.

Aqui entra então o projeto de Deus Pai e sonho de Jesus: Formar comunidade de amor, vista como espaço de relações marcadas pela familiaridade, intimidade, informalidade, como valores integradores “humanos”. Para isso a comunidade deve ser então um lugar de inclusão, vencendo as barreiras do preconceito, da intolerância, dos juízos sobre os outros. Em poucas palavras ter as atitudes de Jesus, verdadeiro senhor de si mesmo e por isso aberto ao diferente, ele soube lutar contra toda forma excludente e discriminatória. Só assim podemos construir comunidades. Muitas vezes, e, infelizmente, ainda em vários setores de nossa Igreja existe este perfil excludente e discriminatório. Basta pensar na própria vida sacramental da Igreja, onde os sacramentos muitas vezes se tornam formas sociais de exclusão e perde até o valor simbólico de união. Lembro-me de uma experiência que tive a alguns anos em uma comunidade rural, onde as pessoas não comungavam. Então perguntei-lhes o porque. Quase todas não eram casadas. Eu me propus a realizar os matrimônios, mas a respostas que eles me deram me faz pensar até hoje! Os maridos acham que o matrimonio não é sinal de bênção mas de maldição, por isso preferem manter-se amigados, pois no momento em que casam se se separam, perdem o céu, mas se estão como estão pode ser que Deus os salve! Veja só: casar ali não é mais expressão de alegria, mas de medo, o sacramento não traz salvação, mas terrorismo do céu!

 Referência Bibliográfica

  1. J. B. Libanio, Cenários da Igreja, Loyola, São Paulo, 20013.
  2. José Comblin, Os Desafios da cidade no século XXI, São Paulo, Paulus, 2002.
  3. José Comblin, Desafios aos cristãos do século XXI, São Paulo, Paulus, 2000.
  4. C. Caliaman, Creio na Igreja Catolica, São Paulo, Paulus, 2007.
  5. W. Kasper, Gesù, il Cristo, Queriniana, Brescia, 1977.
  6. N. Ciola, Introdução à cristologia, Loyola, São Paulo, 1992.
  7. M. Bordoni, Gesù di Nazaret Signore e Cristo. Saggio di cristologia sistematica, I, Problemi di metodo, Herder, Roma,  1982.
  8. H. De Lubac, Esegesi Medievale: I quatro sensi della Scritura, Vol I. Jaca Book, Milano, 2006.
  9. H. Kung, La Chiesa, Queriniana, Brescia, 1992.
  10. H. Kung¸ Essere cristiani, Mondatori, Milao, 19762.
  11. E. Schillebeeckx, Gesù, la storia di un vivente, Queriniana, Brescia, 1976.
  12. P. A. Liégé OP, Le mystère de l’Eglise, corso ciclostilato 1950.
  13. A. Schilson – W. Kasper, Cristologias abordagens contemporâneas, Loyola, São Paulo, 1990.
  14. K. Barth, La Chiesa, Città Nuova, Roma 1970.
  15. Y. Congar, «Structure du sacerdoce chrétien», in La Maison-Dieu 27, 1951).
  16. Cnbb – Em Busca dos Sinais dos tempos: Reflexão crítica sobre a historia dos dias atuais, 2010.
  17. Cnbb – Igreja, Comunidade de comunidades: Experiências e avanços. Projeto Nacional de Evangelização – O Brasil na Missão Continental, 2009.
  18. Celam, CEB’s e pequenas comunidades eclesiais, o texto foi elaborado por José Marins, Missão Continental, Edições Cnbb, 2008.
  19. Celan, Jesus Cristo, vida plena para os povos, texto elaborado por Victor M. Ruano Pineda, Edições Cnbb, 2008.
  20. Celan, Mudanças de época e dialogo intercultural: Um olhar na realidade social, texto elaborado por Fernando Pliego Carrasco. Edições Cnbb, 2008.
  21. Celan, A Pastoral Urbana, texto elaborado por Benjamin Bravo, Edições Cnbb, 2008.

 


[1] H. De Lubac, Esegesi Medievale: I quatro sensi della Scritura, Vol I. Jaca Book, Milano, 2006, 19-37.

[2] H. Kung, La Chiesa, Queriniana, Brescia, 1992, 48-88.

[3] N. Ciola, Introdução à cristologia, Loyola, São Paulo, 1992, 13.

[4] Os Setentas é a expressao que usa para a Bíblia (Tora, Profetas e Escritos) em sua tradução do hebraico para o grego. Atrás desse termo está uma série de lendas que tentam explicar o significado da fidelidade na tradução que os gregos fizeram das Escrituras, para que a tradução pudesse ter peso e força, além dos muros de Israel.

[5] H. Kung¸ Essere cristiani, Mondatori, Milao, 19762, 28.

[6] E. Schillebeeckx, Gesù, la storia di un vivente, Queriniana, Brescia, 1976, 52.

[7] A. Schilson – W. Kasper, Cristologias abordagens contemporâneas, Loyola, São Paulo, 1990.

[8]Leone, Sermo 7 de nativitate Domini, cap. 1: «Abigatur procul terrenarum caligo rationum, et ab illuminatae fidei oculo mundanae sapientiae fumus abscedat», PL 54, 216C. Ef 1, 17.

[9] C. Carreto, Nel Deserto sboccia L’Amore, 27.

[10] Y. Congar, «Structure du sacerdoce chrétien», in La Maison-Dieu 27 (1951), p. 77.

[11] P. A. Liégé OP, Le mystère de l’Eglise, corso ciclostilato 1950, p. 20.

[12] Daqui surge a exegese aventuresca de Mt 19, 28. Analogo excesso foi assinalado na estensao do poder pontifical à Igreja purgante e triunfante: tratava-se porém de jum excesso mais nas palavras que no pensamento. cf. G. Phillips, Du droit ecclésiastique dans ses principes généraux, tr. fr. J. P. Crouzet, 21855, t. I, p. 162.

[13] K. Barth, La Chiesa, Città Nuova, Roma 1970, 31

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