Palestra do frei Carlos

Linguagem simples, exemplos do cotidiano, metáforas precisas, conteúdo profundo.

Estas são algumas das características da palestra do frei Carlos Mesters sobre “Jesus, formando e formador”. A conferência foi feita na manhã desta quinta-feira, 8, juntamente com o biblista Francisco Orofino, para os 480 participantes da 3ª Semana Brasileira de Catequese, em Itaici (SP).

Carlos Mesters chamou a atenção dos catequistas para o jeito de Jesus catequizar e destacou, entre outros modos de Jesus, o diálogo e as parábolas. “O catequista deve ser simpatia ambulante para os catequizandos”, disse o biblista. “Antes de falar de Deus, deve-se irradiar Deus. Jesus não impõe lei, mas irradia Deus”, acrescentou.

Segundo Mesters, as paróbolas contadas por Jesus ajudam a entender o que Ele diz. Além disso, algumas provocam, outras tornam as pessoas contemplativas e outras fazem uma terapia de choque.

JESUS,Formando e Formador Carlos Mesters Francisco Orofino.
Geralmente, quando falamos de Jesus, não costumamos ver nele o formando, mas só o formador. Na realidade, Jesus, igual a nós em tudo, menos no pecado (Hb 4,15), viveu o mesmo
processo de aprendizagem, próprio de todo ser humano. Como todo mundo, crescia em sabedoria,tamanho e graça, diante de Deus e dos homens (Lc 2,52). Naqueles trinta anos em Nazaré, Jesus
“crescia e ficava forte, cheio de sabedoria, e a graça de Deus estava com ele” (Lc 2,40). E mesmo depois, ao longo dos três anos da sua vida como formador dos discípulos e das discípulas, ele ia
aprendendo no contato com o povo, com os discípulos e com os fatos duros da vida. “Mesmo sendo Filho de Deus, aprendeu a ser obediente através de seus sofrimentos” (Hb 5,8). Como todos nós, ele matriculou-se na escola da vida e tornou-se discípulo aplicado de Deus e do povo.
Falando de “Jesus formando e formador”, não se trata de dois períodos distintos, como se nos trinta anos em Nazaré Jesus fosse só formando, e nos outros três anos fosse só formador. Na
realidade, o formando sempre é fator de formação para seu próprio formador. O formador se forma formando seus discípulos. Uma vez tendo formado o discípulo, o formador desaparece.
1. Seguir Jesus
2. O amigo que convive e forma para a vida
3. Jesus forma os discípulos envolvendo-os na missão
4. O método participativo das Parábolas
5. Atento ao processo de formação dos discípulos
6. Conteúdos e recursos didáticos
1. Seguir Jesus
Desde o começo, o objetivo do seguimento é duplo: estar com Jesus, formar comunidade com ele e ir em missão, ou seja, pregar, expulsar os demônios, ser pescador de gente (Mc 1,17; Lc
5,10; Mc 3,13-15)."Seguir Jesus" era o termo que fazia parte do sistema educativo da época. Indicava o relacionamento do discípulo com o mestre. O relacionamento mestre-discípulo é diferente do
relacionamento professor-aluno. Os alunos assistem às aulas do professor sobre uma determinada matéria, mas não convivem com ele. Os discípulos "seguem" o mestre e se formam na convivência
diária com ele, dentro do mesmo estilo de vida. O seguimento de Jesus tinha três dimensões que perduram até hoje e que formam o eixo
central do processo de formação dos discípulos * Imitar o exemplo do Mestre:
Jesus era o modelo a ser recriado na vida do discípulo ou da discípula (Jo 13,13-15). A
convivência diária com o mestre permitia um confronto constante. Nesta "escola de Jesus" só se
ensinava uma única matéria: o Reino! E este Reino se reconhecia na vida e na prática do Mestre. Isto
exige de nós leitura e meditação constantes do Evangelho para olharmos no espelho da vida de Jesus.
2
* Participar do destino do Mestre.
A imitação do Mestre não era um aprendizado teórico. Quem seguia Jesus devia
comprometer-se com ele e "estar com ele nas tentações" (Lc 22,28), inclusive na perseguição (Jo
15,20; Mt 10,24-25). Devia estar disposto a carregar a cruz e a morrer com ele (Mc 8,34-35; Jo 11,16).
Isto exige de nós um compromisso concreto e diário de fidelidade com o mesmo ideal comunitário
com que Jesus, fiel ao Pai, se comprometia.
* Ter a vida de Jesus dentro de si.
Depois da Páscoa, surge uma terceira dimensão, fruto da fé na ressurreição e da ação do
Espírito na vida das pessoas. Trata-se da experiência pessoal da presença de Jesus ressuscitado, que
levava os primeiros cristãos a dizer: "Vivo, mas já não sou eu, é Cristo que vive em mim" (Gl 2,20).
Eles procuravam refazer em suas vidas a mesma caminhada de Jesus que tinha morrido em defesa da
vida e foi ressuscitado pelo poder de Deus (Fl 3,10-11). Isto exige de nós uma espiritualidade de
entrega contínua, alimentada na oração.
Tanto a convivência comunitária estável ao redor de Jesus e a missão itinerante através
dos povoados da Galiléia, as duas dimensões fazem parte do mesmo processo de formação. Uma não
exclui a outra. Pelo contrário! Elas se completam mutuamente. Uma sem a outra, não se realiza, pois a
missão consiste em reconstruir a vida em comunidade.
2. O amigo que convive e forma para a vida
Ao longo daqueles três anos, Jesus acompanhava os discípulos. Ele era o amigo (Jo
15,15) que convivia com eles, comia com eles, andava com eles, se alegrava com eles, sofria com eles.
Era através desta convivência que eles se formavam. Muitos pequenos gestos refletem o testemunho de
vida com que Jesus marcava presença na vida dos discípulos e das discípulas: o seu jeito de ser e de
conviver, de relacionar-se com as pessoas e de acolher o povo que vinha falar com ele. Era a maneira
de ele dar forma humana à sua experiência de Deus como Pai:
* Amigo, comparte tudo, até mesmo o segredo do Pai (Jn 15,15).
* Carinhoso, provoca respostas fortes de amor (Lc 7,37-38; 8,2-3; Jo 21,15-17;
Mc 14,3-9; Jo 13,1).
* Atencioso, preocupa-se com a alimentação dos discípulos (Jo 21,9), cuida do descanso
deles e procura estar a sós com eles para repousar (Mc 6,31).
* Pacífico, ele inspira paz e reconciliação: "A Paz esteja com vocês!" (Jn
20,19; Mt 10,26-33; Mt 18,22; Jn 20,23; Mt 16,19; Mt 18,18).
* Compreensivo, aceita os discípulos do jeito que são, até mesmo a fuga, a negação
e a traição, sem romper com eles (Mc 14,27-28; Jn 6,67).
* Comprometido, defende os amigos quando são criticados pelos adversários (Mc
2,18-19; 7,5-13).
* Manso e humilde, convida os pobres e oprimidos: "Venham todos a mim" (Mt 11,28).
* Exigente, pede para deixar tudo por amor a ele (Mc 10,17-31).
* Sábio, conhece a fragilidade dos seus discípulos, sabe o que se passa no
coração deles e, por isso, insiste na vigilância e ensina-os a rezar
(Lc 11,1-13; Mt 6,5-15).
* Homem de oração, aparece rezando em todos os momentos importantes de sua vida e
desperta nos discípulos a vontade de rezar: "Senhor, ensina-nos a
rezar!" (Lc 11,1-4; Lc 4,1-13; 6,12-13; Jn 11,41-42; Mt 11,25; Jn
17,1-26; Lc 23,46; Mc 15,34)
* Humano, Jesus é humano, muito humano, “tão humano como só Deus pode
ser humano” dizia o Papa Leão Magno (Séc. V). Ele veio nos
mostra o caminho para quem quer ser divino: antes de tudo ser
profundamente humano! (cf. Fl 2,6-11)
3
Deste modo, pelo seu jeito de ser e por este seu testemunho de vida, Jesus encarnava o
amor de Deus e o revelava aos discípulos e discípulas (Mc 6,31; Mt 10,30; Lc 15,11-32). “Quem vê a
mim, vê o Pai” (Jo 14,9). Tornava-se para eles uma pessoa significativa que os marcou pelo resto de
sua vida como "caminho, verdade e vida" (Jo 14,6).
3. Jesus forma os discípulos envolvendo-os na missão
Desde o primeiro momento do chamado, Jesus envolve os discípulos na missão que ele
mesmo estava realizando em obediência ao Pai. A participação efetiva no anúncio do Reino faz parte
do processo formador, pois a missão é a razão de ser da vida comunitária ao redor de Jesus. (Lc 9,1-2;
10,1). Eles devem ir, dois a dois, para anunciar a chegada do Reino (Mt 10,7; Lc 10,1.9), curar os
doentes (Lc 9,2), expulsar os demônios (Mc 3,15), anunciar a paz (Lc 10,5; Mt 10,13) e rezar pela
continuidade da missão (Lc 10,2). Eis alguns aspectos desta sua atitude formadora com relação à
missão:
* corrige-os quando erram e querem ser os primeiros (Mc 9,33-35; 10,14-15)
* sabe aguardar o momento oportuno para corrigir (Lc 9,46-48; Mc 10,14-15).
* ajuda-os a discernir (Mc 9,28-29),
* interpela-os quando são lentos (Mc 4,13; 8,14-21),
* prepara-os para o conflito e a perseguição (Jo 16,33; Mt 10,17-25),
* manda observar a realidade (Mc 8,27-29; Jo 4,35; Mt 16,1-3),
* reflete com eles as questões do momento (Lc 13,1-5),
* confronta-os com as necessidades do povo (Jo 6,5),
* ensina que as necessidades do povo estão acima das prescrições rituais (Mt 12,7.12),
* esquece o próprio cansaço e acolhe o povo que o procura (Mt 9,36-38).
* tem momentos a sós com eles para poder instruí-los (Mc 4,34; 7,17; 9,30-31; 10,10; 13,3),
* sabe escutar, mesmo quando o diálogo é difícil (Jo 4,7-30).
* ajuda as pessoas a se aceitarem a si mesmas (Lc 22,32).
* é severo com a hipocrisia (Lc 11,37-53).
* faz mais perguntas do que respostas (Mc 8,17-21).
* é firme e não se deixa desviar do caminho (Mc 8,33; Lc 9,54).
* desperta liberdade e libertação: "O ser humano não foi feito para o sábado, mas o
sábado para o ser humano!" (Mc 2,27; 2,18.23)
* depois de tê-los enviado em missão, na volta faz revisão com eles (Lc 9,1-2;10,1;
10,17-20)
* desperta a atenção dos discípulos para as coisas da vida através do ensino das Parábolas
(Lc 8,4-8).
4. O método participativo das parábolas
Jesus tinha uma capacidade muito grande de inventar parábolas ou pequenas histórias
para comparar as coisas de Deus, que não são tão evidentes, com as coisas da vida do povo que
todos conheciam e experimentavam diariamente na sua luta pela sobrevivência. Isto supõe duas
coisas: estar por dentro das coisas da vida do povo, e estar por dentro das coisas de Deus, do Reino
de Deus.
A parábola é uma forma participativa de ensinar e de educar. Não dá tudo trocado em
miúdo. Não faz saber, mas faz descobrir. Ela muda os olhos, faz a pessoa ser contemplativa,
observadora da realidade. Leva a pessoa a refletir sobre a sua própria experiência de vida, e faz com
4
que esta experiência a leve a descobrir que Deus está presente no cotidiano da vida de cada dia. Por
exemplo, o agricultor que escuta a parábola da semente, diz: “Semente no terreno, eu sei o que é.
Mas Jesus diz que isso tem a ver com o Reino de Deus. O que será que ele quis dizer com isto?” E aí
você pode imaginar as longas conversas do povo e dos discípulos em torno das parábolas que Jesus
contava.
A parábola provoca. Em algumas parábolas acontecem coisas que não costumam
acontecer na vida normal. Por exemplo, onde se viu um pastor de cem ovelhas abandonar noventa e
nove no deserto para encontrar aquela única ovelha que se perdeu? (Lc 15,4) Onde se viu um pai
acolher com festa o filho devasso, sem dar nenhuma palavra de censura? (Lc 15,20-24). Onde se viu
um samaritano ser melhor que o levita e o sacerdote? (Lc 10,29-37). A parábola traz um exagero
pedagógico. Ela provoca assim para levar o ouvinte a pensar. Ela leva a pessoa a se envolver na
história a partir da sua própria experiência de vida.
Uma vez um bispo perguntou numa reunião da comunidade: “Jesus falou que devemos
ser como sal. Para que serve o sal?” Discutiram e, no fim, partilhando entre si suas experiências com
o sal, encontraram mais de dez finalidades para o sal. Aí eles foram aplicar tudo isto à sua própria
vida e descobriram que ser sal é difícil e exigente! A parábola funcionou e ajudou-os a dar um passo.
Iniciaram a travessia em direção ao Reino!
Certa vez, por ocasião da parábola da semente, os discípulos perguntaram a Jesus o que
ele queria ensinar por meio daquela parábola. Jesus disse: "Para vocês, foi dado o mistério do Reino
de Deus; para os que estão fora tudo acontece em parábolas, para que olhem, mas não vejam,
escutem, mas não compreendam, para que não se convertam e não sejam perdoados." (Mc 4,11-12).
Jesus distingue duas categorias de pessoas: “os de fora” e os “de dentro”. Aos de dentro, isto é, aos
discípulos que convivem com Jesus e acreditam nele, é dado conhecer o mistério do Reino, pois o
mistério do Reino era o próprio Jesus. Jesus é a semente do Reino. Aos de fora, isto é, aos que não
faziam parte da “família de Jesus”, tudo é dito em parábolas, “para que vendo não vejam”. Estes, os
de fora, sabem o que é semente, mas não sabem que o próprio Jesus é esta semente. Alguns deles,
como por exemplo, aqueles fariseus e os herodianos que queriam matar Jesus (Mc 3,6), nunca
aceitariam Jesus ser a semente do Reino. Por isso, mesmo vendo não enxergam e ouvindo não
entendem. E por causa desta cegueira eles se excluem a si mesmos do Reino.
Só poucas vezes Jesus explica as parábolas. Geralmente, ele diz: "Quem tem ouvidos
para ouvir ouça!" (Mt 13,9; 11,15; 13,43; Mc 7,16). Ou seja: "É isso! Vocês ouviram! Agora tratem
de entender!" De vez em quando, em casa, ele dava explicação aos discípulos (Mc 4,34-34). Isto
significa que o ensino em parábola era um voto de confiança de Jesus na capacidade do povo e dos
discípulos de entenderem o seu ensinamento. É bom para o formando saber e experimentar que o
formador acredita nele e na sua capacidade de assimilar e compreender as coisas.
5. Atento ao processo de formação dos discípulos
Não é pelo fato de uma pessoa andar com Jesus e de conviver com ele que ela já seja
santa e renovada. O “fermento de Herodes e dos fariseus” (Mc 8,15), a ideologia dominante da época,
tinha raízes profundas na vida daquele povo. A conversão que Jesus pedia e a formação que ele dava
procuravam atingir e erradicar de dentro deles esse “fermento” da ideologia dominante.
Também hoje, a ideologia do sistema neoliberal renasce sempre de novo na vida das
comunidades e dos discípulos e discípulas. O "fermento do consumismo" tem raízes profundas na
vida, tanto dos formandos como dos formadores, e exige uma vigilância constante. Jesus ajudava os
discípulos a viverem num processo permanente de formação.
Vamos ver alguns casos desta vigilância com que Jesus os acompanhava e os ajudava a
tomarem consciência do “fermento de Herodes e dos fariseus”. É a ajuda fraterna com que ele, atento
ao processo de formação dos discípulos, intervinha para ajudá-los a dar um passo e criar nova
consciência:
1. Mentalidade de grupo fechado.
Certo dia, alguém que não era da comunidade, usava o nome de Jesus para expulsar os
demônios. João viu e proibiu. Ele disse a Jesus: “Impedimos, porque ele não anda conosco” (Mc 9,38).
5
João pensava ter o monopólio de Jesus e queria proibir que outros usassem o nome dele para realizar o
bem. Era a mentalidade antiga de "Povo eleito, Povo separado!". Jesus responde: "Não impeçam!
Quem não é contra é a favor!" (Lc 9,39-40). Para Jesus, o que importa não é se a pessoa faz ou não faz
parte da comunidade, mas sim se ela faz ou não o bem que a comunidade anuncia a todos em nome de
Deus.
2. Mentalidade do grupo que se considera superior aos outros.
Certa vez, os samaritanos não queriam dar hospedagem a Jesus. A reação de alguns
discípulos foi violenta: “Que um fogo do céu acabe com esse povo!” (Lc 9,54). Queriam imitar o
profeta Elias (cf. 2Rs 1,10-11). Achavam que, pelo fato de estarem com Jesus, todos deviam acolhêlos.
Pensavam ter Deus do seu lado para defendê-los. Era a mentalidade antiga de “Povo eleito, Povo
privilegiado!”. Jesus os repreende: "Vocês não sabem de que espírito estão sendo animados" (Lc 9,55).
3. Mentalidade de competição e de prestígio.
Os discípulos brigavam entre si pelo primeiro lugar (Mc 9,33-34). Era a mentalidade de
classe e de competição, que caracterizava a sociedade do Império Romano. Ela já se infiltrava na
pequena comunidade que estava apenas nascendo ao redor de Jesus. Jesus reage e manda ter a
mentalidade contrária : "O primeiro seja o último" (Mc 9,35). É o ponto em que ele mais insistiu e em
que mais deu o próprio testemunho: “Não vim para ser servido, mas para servir” (Mc 10,45; Mt 20,28;
Jo 13,1-16).
4. Mentalidade de quem marginaliza o pequeno.
Mães com crianças querem chegar perto de Jesus. Os discípulos as afastam. Era a
mentalidade da cultura da época na qual criança não contava e devia ser disciplinada pelos adultos. Era
ainda o medo de que as mães e as crianças, tocando em Jesus com mãos impuras, causassem alguma
impureza em Jesus. Mas Jesus os repreende: ”Deixem vir a mim as crianças!” (Mc 10,14). Ele os
acolhe, abraça e abençoa. Coloca a criança como professora de adulto: “Quem não receber o Reino
como uma criança, não pode entrar nele” (Lc 18,17). Transgride aquelas normas da pureza legal que
impedem o acolhimento e a ternura.
5. Mentalidade de quem segue a opinião da ideologia dominante.
Certo dia, vendo um cego, os discípulos perguntaram a Jesus: "Quem pecou, ele ou seus
pais, para que nascesse cego?" (Jo 9,2). Como hoje, o poder da opinião pública era muito forte. Fazia
todo mundo pensar do mesmo jeito de acordo com a ideologia dominante. Enquanto se pensa assim
não é possível perceber todo o alcance da Boa Nova do Reino. Jesus os ajuda a ter uma visão mais
crítica: “Nem ele, nem os pais dele, mas para que nele se manifestem as obras de Deus” (cf Jo 9,3). A
resposta de Jesus supõe uma consciência nova e uma leitura diferente da realidade.
Estes e muitos outros episódios mostram como Jesus estava atento ao processo de
conversão e de formação em que se encontravam seus discípulos. Isto revela duas características em
Jesus: 1) Possuía uma visão crítica, tanto da sociedade em que ele vivia, como da ideologia ou
“fermento” que os grandes comunicavam aos súditos. 2) Tinha uma percepção clara de como este
“fermento”, disfarçadamente, se infiltrava na vida das pessoas. Pois de certo modo, eles pensavam
agradar a Jesus quando proibiam as mães aproximar-se de Jesus ou quando pediam para Deus fazer
baixar o fogo do céu.
6. Conteúdos e Recursos didáticos
O sistema educativo da época era bem diferente de hoje. Jesus era Mestre, Rabino. Não
era professor. Seus formandos não eram alunos, mas sim discípulos e discípulas. Mesmo assim, apesar
de ser diferente de hoje, vamos arriscar uma resposta para a seguinte pergunta: Quais eram os
conteúdos e recursos didáticos em que Jesus mais insistia e a que dava mais atenção no processo de
formação dos discípulos?
* O testemunho de vida.
O recurso básico que Jesus utiliza na formação dos discípulos é o testemunho de sua vida:
"Segue-me" (Lc 5,27). “Venham e vejam” (Jo 1,39). "Eu sou o caminho, a verdade e a vida" (Jn
6
14,16). O discípulo tem na vida do Mestre uma norma (Mt 10,24-25). Neste seu testemunho de vida
Jesus reflete para os discípulos os traços do rosto de Deus: "Quem me vê, vê o Pai" (Jo 14,9). A raiz da
Boa Nova é Deus, o Pai. A raiz da transparência de Jesus é a sua fidelidade ao Pai e a sua coerência
com a Boa Nova que anuncia e irradia.
* A Vida e a natureza.
Jesus descobre a vontade do Pai nos fenômenos mais comuns da natureza e a transmite
aos discípulos e discípulas: na chuva que cai sobre bons e maus ele descobre a misericórdia do Pai que
acolhe a todos (Mt 5,45); nos pássaros do céu e nos lírios do campo ele descobre os sinais da Divina
Providência (Mt 6,26-30). A sua maneira de ensinar em parábolas provoca os discípulos a refletirem
sobre as coisas mais comuns do dia a dia da sua vida (Mt 13,1-52; Mc 4,1-34). As parábolas de Jesus
são um retrato da vida do povo e da realidade confusa e conflituosa da época.
* As grandes questões do momento e as perguntas do povo.
O crime de Pilatos contra alguns romeiros da Galiléia, a queda da torre de Siloé em
construção que matou 18 operários (Lc 13,1-4), a discussão dos discípulos em torno de quem deles era
o maior (Mc 9,33-36), a fome do povo (Lc 9,13), o ensinamento dos escribas (Mc 12,35-37) e tantos
outros problemas, fatos e perguntas do povo funcionavam como gancho para Jesus levar os discípulos
a refletir, a cair em si e a descobrir algum ensinamento ou apelo de Deus.
* O jeito de ensinar em qualquer lugar.
Em qualquer lugar onde encontrava gente para escutá-lo, Jesus transmitia a Boa Nova de
Deus: nas sinagogas durante a celebração da Palavra nos sábados (Mc 1, 21; 3,1; 6,2); em reuniões
informais nas casas de amigos (Mc 2,1.15; 7,17; 9,28; 10,10); andando pelo caminho com os
discípulos (Mc 2,23); ao longo do mar na praia, sentado num barco (Mc 4,1); no deserto para onde se
refugiou e onde o povo o procurava (Mc 1,45; 6,32-34); na montanha, de onde proclamou as bemaventuranças
(Mt 5,1); nas praças das aldeias e cidades, onde povo carregava seus doentes (Mc 6,55-
56); no Templo de Jerusalém, por ocasião das romarias, diariamente, sem medo (Mc 14,49).
* Memorização na base da repetição.
Não havia livros, nem manuais como hoje. O ensina era baseado na repetição do conteúdo
a fim de favorecer a memorização. Isto ainda transparece em algumas partes dos discursos de Jesus,
conservados nos evangelhos. O final do Sermão da Montanha, por exemplo, repete duas vezes, de
maneira rítmica, com poucas diferenças, a mesma frase (Mt 7,24-25 e 26-27).
* Momentos a sós com os discípulos.
Várias vezes, Jesus convida os discípulos para ir com ele a um lugar distante, seja para
instruir (Mc 4,34; 7,17; 9,30-31; 10,10; 13,3), seja para descansar (Mc 6,31). Ele chegou a fazer uma
longa viagem ao exterior na terra de Tiro e Sidônia para poder estar a sós com eles e instruí-los a
respeito da Cruz (Mc 8,22-10,52).
* A Bíblia e a história do povo.
Nem sempre é possível discernir se o uso que os evangelhos fazem do AT vem do próprio
Jesus ou se é uma explicitação dos primeiros cristãos que, assim, expressavam o alcance da sua fé em
Jesus. Seja como for, é inegável o uso constante e frequente que Jesus fazia da Bíblia. Ele conhecia a
Bíblia de cor e salteado. Como ainda veremos, Jesus se orientava pela Sagrada Escritura para realizar
sua missão e ele a usava para instruir os discípulos e o povo.
* A Cruz e o sofrimento.
Quando ficou claro para Jesus que as autoridades religiosas não iam aceitar a sua
mensagem e que decidiram matá-lo, ele começou a falar da cruz que o esperava em Jerusalém (Lc
9,31). Isto provocou reações fortes nos discípulos (Mc 8,31-33), pois na lei estava escrito que um
crucificado era um “maldito de Deus” (Dt 21,22-23). Como um maldito de Deus poderia ser o
Messias? Por isso, a partir deste momento crítico, o eixo da formação que Jesus dava aos discípulos
consistia em ajudá-los a superar o escândalo da Cruz (Mc 8,31-34; 9,31-32; 10,33-34).
Estes são alguns dos recursos didáticos usados por Jesus na formação dos discípulos e
discípulas. Alguns destes recursos eram diferentes de hoje, outros eram iguais.

Você pode Gostar de:

Animação Bíblico-catequética

O mundo da comunicação consegue globalizar e aproximar, unificar e encurtar distâncias. No seio da mídia moderna encontramos um espaço enorme de possibilidades “de linguagens e símbolos, métodos dinâmicos para a comunicação de todo tipo de mensagem” (DNC 168). A Comissão Episcopal Pastoral para a Animação Bíblico-catequética da CNBB tem consciência de que não pode prescindir dos recursos tecnológicos para a sua evangelização, para o anúncio da mensagem de Jesus. Segundo o integrante da Comissão, dom Paulo Mendes Peixoto “não podemos deixar de marcar presença junto aos meios de comunicação, especialmente os mais massivos e mais utilizados pelo povo para expressar a fé em linguagem capaz de realmente comunicar”.Pensando nas palavras de dom Paulo, foi criado em setembro de 2010 o blog Catequese e Bíblia, que tem como objetivo divulgar as ações e os trabalhos da Comissão, dos Regionais e dos catequistas pelo Brasil e pelo mundo, com notícias, artigos de formação, reflexões, depoimentos, material e partilha. Com o intuito de incrementar o blog, nasceu no último dia 1º de abril, a primeira equipe do blogger Catequese e Bíblia, que tem como coordenadores o presidente da Comissão Bíblico-catequética, dom Jacinto Bergmann; o arcebispo de Uberaba (MG), dom Paulo Mendes Peixoto; e os assessores da Comissão, Maria Cecília Rover e padre Décio Walker.
O blog é administrado por Joseilton Luz, leigo e que trabalha na Comunicação Social do Exército Brasileiro e faz parte da Comissão Arquidiocesana de Catequese de Maceió (AL).