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Senhor, tudo sabes tudo, tu sabes que te amo!

Senhor, tudo sabes tudo, tu sabes que te amo!  – Terceiro Domingo da  Páscoa.
At 5,27b-32.40b-41; Ap 5,11-14; Jo 21,1-19.
Queridos irmãos e irmãs internautas, a liturgia de hoje nos propõe três textos belíssimos: o primeiro é tirado dos Atos dos Apóstolos, narra-nos a maravilhosa coragem cristã nascida da Páscoa de Cristo; a covardia de Pedro se transforma em fonte segura de testemunho e de amor; a segunda leitura é um trecho do Apocalipse, onde S. João nos fala da transformação ocorrida na história humana por meio do Cordeiro Pascal; e por fim, temos o belo trecho do Evangelho de São João, no qual Jesus confia a Pedro, os seus cordeiros e as suas ovelhas.

Este trecho do Evangelho de hoje é verdadeiramente belo e comovente, porque vem depois da paixão de Jesus; portanto, logo após a Ressurreição de Jesus e a negação de Pedro.
Segundo a tradição exegética, este capítulo 21 do evangelho de São João teria sido um acréscimo posterior à morte do discípulo amado; a comunidade de João sentiu a forte necessidade de salvaguardar a memória de Pedro, sua relevância na comunidade cristã primitiva. É daqui que nasce toda a profundidade deste trecho e de sua beleza, que chega a encantar-nos ainda hoje, quando compreendemos o pano de fundo que reveste este evangelho.
A fonte da nova compreensão nos vem da ressurreição de Jesus que lança uma luz vivíssima sobre todas as palavras do Evangelho e nos ajuda a compreender o sentido desta defesa do discípulo do amor (João) pela figura oficial da Igreja, o apóstolo Pedro. Aqui se ilumina para nós o novo sentido da Igreja, representada pelas imagens viventes dos discípulos que estão nesta cena do Evangelho. João faz questão de lançar a ponte do contraste entre a noite do vazio da pesca, do esforço sem resultados, do trabalho infecundo e estéril, nascido do abandono da própria missão, o grande perigo da esterilidade de nossas vidas; e ao mesmo tempo, o surgimento do sol, a virada de todas as frustrações humanas pela figura de Jesus que nos espera na margem do rio, ao iniciar o novo dia. A barca é símbolo da Igreja. Os sete discípulos liderados por Pedro são figuras da plenitude da Igreja.
Vejamos bem a figura de Pedro: Pedro foi designado pelo Senhor como o primeiro dos apóstolos… Mas quanta dureza e lentidão para compreender o sentido desta escolha.
Vamos refletir: Pedro volta a pescar, seguido de outros discípulos. A última vez que isto acontecera foi a três anos antes, no mesmo lago, perto da sua casa, em Cafarnaum. Foi uma pesca que mudou sua vida. Mas agora estava tudo acabado. O Mestre foi morto pelos inimigos, terminou a bela aventura. Como na descrença de Tomé, também nesta cena impera o cansaço, a fragilidade e a decepção.
Mais uma vez os apóstolos vivem situações que são nossas também: o desconforto de crer sem resultado, a sensação de impotência ao pé da cruz. E ali, na sombra do fracasso, Jesus os espera, que cena linda para nossa imaginação.
Os apóstolos haviam abandonado suas redes para se tornarem pescadores de homens, e agora Jesus lhes aparece, sem que o reconheçam, e se repete a cena do início. Também dessa vez os pescadores se esforçam em vão a noite toda. É a experiência de um trabalho sem resultado, a experiência de pensamentos, preocupações e agitações de um trabalho que não deu em nada. Sem a luz do Evangelho é difícil produzir frutos.
Mas com Jesus que se aproxima, surge a aurora de um novo dia. Esse novo encontro com o Ressuscitado, acontece numa situação ordinária e banal, até mesmo pelo insucesso inicial da pesca.
Parece que o ressuscitado prefere o dia a dia como lugar ideal para se manifestar. Ele pode ser encontrado no silêncio de uma capela, do quarto, como também no barulho de uma fabrica. O que importa é que o coração esteja aberto, o olhar esteja vigilante para perceber os sinais de sua presença e poder prontamente reconhecê-lo como o fez João: é o Senhor.
De fato o amor sabe reconhecer a presença do amado, como gostava de repetir Karl Rahner: “é preciso amar Jesus”. É Ele o SENHOR, Aquele que nos interpela nessa e naquela situação. É ele que vem ao nosso encontro na atenção de quem notou nosso cansaço….é ainda ele que se aproxima de nós no momento da dificuldade, quando nossas redes parecem vazias e então………..como é belo fazer como Pedro, mergulhar no mar aberto da vida para um renovado testemunho de amor. Não importa se, como Apóstolo, trazemos no coração a amarga experiência de tantas infidelidades, Ele está ai, na praia de nosso cotidiano, pronto a oferecer-nos o pão da reconciliação e a acolher o dom daquele peixe que ele mesmo nos fez pescar.
E Jesus ainda come com eles, como fazia antes de morrer, mas aqui acontece em uma cena especial. Jesus chama Pedro à aparte e hoje a nós….e pergunta: “Tu me amas mais que estes”: Pedro não é repreendido por Jesus pela traição, deseja apenas saber se o ama ainda. Mas é necessário agora um amor maduro, amadurecido pela humildade, pela mansidão de quem aprendeu que amar não é competir, nem rivalizar, nem muito menos o gosto pelo aparecer. Certa vez, ao ser confrontado Pedro disse de forma decisiva: “mesmo que todos se escandalizarem de ti, eu não me escandalizarei”. Na cena da paixão, ele prometeu de estar com o Senhor todo o tempo. Sempre tomou a frente do grupo. Eram tentativas de amor, mas ainda não era o amor pobre, humilde, simples… o amor que não humilha, que tudo suporta, que tudo crê, que tudo espera. Pedro precisa, como nós também, de ser educado na escola do amor.
Por isso a pergunta se repete por três vezes. Não é questão de purificar a memória e relembra a dor da traição passada, mas de renovar o amor, fortificando-o na humildade. Por isso, Jesus não lhe pergunta só uma vez, mas 3 vezes e por 3 vezes depois da resposta afirmativa, Jesus lhe confia o encargo de cuidar do seu rebanho, e a única força, a única energia que nos sustenta é o AMOR pelo SENHOR. E quem ama a Deus serve aos irmãos na gratuidade, porque é obra de amor apascentar o rebanho do Senhor.
Hoje somos convidados a confirmar mais uma vez esse amor… Para isso “é preciso amar Jesus”.
A quase cinco anos atrás eu escolhia esta resposta de Pedro para confirmar o chamado de Deus em minha vida e ainda guardo vivo o sentido desta resposta que dava a Cristo Senhor no dia de minha ordenação. O medo me rodeava, a sensação de impotência era muito forte, a insegurança de que não seria capaz parecia ser minha única certeza, e, no entanto, de dentro de mim, vinha aquela voz mais forte do que qualquer voz humana, que me convidava à aventura da fé e do amor, por isso arrisquei e por isso entrai nesta escola de Pedro, para aprender do Mestre Jesus a maior arte da humanidade.
Assim gostaria de finalizar esta homilia com uma pequena meditação do teólogo Karl Rahner que me ajudou muito a vivenciar o mistério do amor de Deus ligado como o rebanho do Senhor: “Mas, Jesus é Deus feito homem. A relação com Deus passa pela mediação de sua humanidade. Essa mediação é, para os homens que somos, um dado que tem toda sua espessura, pois envolve o destino de um homem que nasceu, viveu e morreu e que a fé reconhece como ressuscitado e como permanecendo a direita de Deus. Esse Jesus Filho de Deus nos amou com um coração de homem, expressou sua ternura àqueles que ele encontrava de um modo assombroso, ele foi até a morte de cruz e seu costado foi aberto com um golpe de lança para espalhar sangue e água”.
Neste sentido, Ranher faz um passo muito importante onde então ele convida seu leitor a “ousar uma relação” com Jesus:
 “Toda relação de confiança e de amor com outro ser humano inclui um inelutável mais de decisão e de audácia, que ultrapassa  toda reflexão operada previamente sobre o que pode justificar tal audácia e dar-lhe sentido…além do que dizem as ciências históricas, exegéticas e críticas, ela é sempre um mais na ordem da liberdade, na audácia da decisão e, mais precisamente, na ordem do amor, desde que se trate  de uma relação efetivamente cristã com Jesus (…).
É por isso que o amor a Jesus cria abertura do amor pelos irmãos”.(Karl Rahner)
A força disso se da numa nova orientação de nossas vidas voltadas para a vida nova em Cristo. Dali brota a coragem, a decisão de continuar no caminho do amor e da perseverança.
“Os apóstolos saíram do Conselho, muito contentes, por terem sido considerados dignos de injúrias, por causa do nome de Jesus” e “com grande força os apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus”. É essa ainda a nossa missão dar testemunho da ressurreição do Senhor Jesus com grande vigor, e isto se faz na maioria das vezes com palavras, mas sobretudo por meio da vida. Faz-se muito melhor com os atos do que com as simples palavras: é a nossa vida que deve dar testemunho da força da ressurreição de Jesus, fazendo ver onde está a verdadeira vida e onde, ao contrário, encontra-se a velha vida, que agente busca sempre, iludindo-se que ali exista alegria e felicidade. Vida presa ao egoísmo, à frivolidade, vida feita de competição e rivalidade, fonte das raivas e invejas nas relações, que vão corroendo até ao íntimo todo tipo sadio de relacionamento e de presença do amor entre nós. Enquanto que a nova vida tem sua raiz na caridade, nos novos laços da fraternidade nascida da solidariedade que Jesus teve para conosco, unindo assim o amor a ele aos pequeninos de seu reino, ou seja todos os desesperados, feridos pela fome e miséria, marcados pela solidão de uma doença ou da ausência de pessoas queridas e amadas. Aqui está realmente a fonte de nova vida nascida da caridade, da esperança, da fé e da luz de Cristo ressuscitado.
E tudo isso podemos testemunhar em cada momento de nossa vida, deixando o peso das coisas velhas, “das coisas da carne”, das nossas mesquinharias humanas, às quais somos atraídos as vezes pelo cansaço físico, mas também pelas fraquezas morais: covardia, ressentimentos, vaidade, amor próprio. Aqui estão as coisas velhas, falsas, sem valor.
Quando se faz isso é possível então realizar a inversão traçada pelo livro do Apocalipse de hoje: “O Cordeiro imolado é digno de receber o poder, a riqueza, a sabedoria e a força, a honra, a glória, e o louvor”. Ouvi também todas as criaturas que estão no céu, na terra, debaixo da terra e no mar, e tudo o que neles existe, e diziam: “Ao que está sentado no trono e ao Cordeiro, o louvor e a honra, a glória e o poder para sempre”. Os quatro Seres vivos respondiam: “Amém”, e os Anciãos se prostraram em adoração daquele que vive para sempre. Com este novo modo de proceder nos tornamos soberanos porque participamos da soberania do Cordeiro por meio da obediência e do amor e não mais do servilismo e da competição, fonte de tantas tristezas e desilusões humanas.

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